Acorda Amor, projeto musical composto por cinco das maiores vozes da música brasileira atual, Liniker, Letrux, Maria Gadú, Luedji Luna e Xênia França realizou três shows esgotados no Sesc Pompéia no último final de semana (31, 1 e 2), em comemoração aos dois anos do grupo e lançando o álbum do conjunto, pelo Selo Sesc.

A inspiração por trás do projeto, conta Roberta Martinelli, uma das idealizadoras e diretora artística do Acorda Amor, se centra nos gritos entalados devido à situação do Brasil, tendo necessidade de colocar tudo que estava dentro, no palco, em formato de arte como agente transformador da nossa sociedade. 

No fim da tarde chuvosa do dia 2, o público diversificado, porém com muito em comum: eletrizados na expectativa do espetáculo que estavam prestes a assistir, e, assim que as luzes se apagam e a voz do rapper Edgar ecoa pelo teatro: “Acorda, amor/ o teto vai cair em cima de você/ sai logo da cama, vai/ vamo lutar”, o pedido da faixa “Sem Preguiça de Fazer Revolução”, que encerra o CD do grupo, mantinha o público atento e reflexivo, quando, de repente, “Eu não quero mais conversa/com quem não tem amor”, Maria Gadú declara, cantando a canção de Erasmo Carlos “Gente Aberta”, de 1972.

A partir disso, a presença gradual de cada uma das intérpretes provoca gritos e palmas de um público dividido pelas cortinas no meio do palco do Sesc Pompéia, e, quando, finalmente, todas estão no palco, a cortina sobe e as artistas se encontram em uma só voz, pela primeira vez na noite, e, as complementando, incríveis músicos que, juntos às cantoras, proporcionaram e causam uma verdadeira fusão de energia, otimismo, força e personalidade. 

O palco, tomado pela cor do amor, o vermelho, era composto, além do figurino de cada membro do grupo, por fitas vermelhas no chão com o nome do projeto, fitas estas que em 2018, na primeira temporada de shows do Acorda Amor, eram compostos por pétalas de rosas, mas, por uma motivação em prol do meio ambiente, foi necessário pensar no que poderia substituí-las, explica Roberta Martinelli, que assinou a direção artística junto à Décio 7 “Eu tive a ideia de colocar as fitinhas do Acorda Amor, a fitinha sendo um símbolo de desejos, a gente amarra essas fitinhas muitas vezes pedindo coisas, então era importante que esses desejos estivessem no palco, e que esses desejos fossem depois compartilhados com o público”, conta.

Os desejos foram feitos através de canções clássicas e tesouros escondidos da MPB, “Sujeito de Sorte” (1976), de Belchior, cantada por Letrux, “Comportamento Geral” (1973), de Gonzaguinha, por Xênia França e “Chorando Pela Natureza” (1994), de João Nogueira, interpretada por Liniker, além da recente “Triste Louca ou Má” (2016), de Francisco El Hombre, interpretada com maestria por Maria Gadú, e proporcionando um dos momentos mais emocionantes do espetáculo, em que todas as mulheres no palco se juntam em seu meio para, juntas, se abraçarem e renovarem forças necessárias para o desafio que é ser mulher.

O auge da noite foi na voz de Luedji Luna, recitando parte de sua faixa “Iodo”, presente em seu álbum de 2017, Um Corpo no Mundo, incorporando o verdadeiro trovão que ela diz ser, e acrescentando, ao listar diversos movimentos de ódio e extermínio que já ocorreram no mundo, tal como o fascismo e nazismo, ela lembra: “Nada.”, reforça: “Sabe o que é nada?” e declara: “Nada acabou com o meu povo.”

Assim segue a noite, embalada por um grande manifesto, com grandes cantoras, essas que se completam de maneira precisa, em suas personalidades, vozes e estilos únicos, e conseguiram, também, se unir com todos os componentes da banda como uma grande família e membros vitais para o Acorda Amor viver, além de todos e todas ultrapassarem os degraus do palco e receberem o público nesse círculo de energia em formato de espetáculo, show este que proporcionou momentos de alegria, otimismo, intercalados com desespero e lamento, o som nítido de quem, apesar de tudo e todos, acorda para fazer a revolução.

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