Em meio à grandes vozes femininas tomando e transformando a cena musical brasileira, Manuella Terra (bateria) e Carolina Mathias (baixo), que formam a Troá, conseguem ecoar seus sons e palavras em um caminho, com sorte, sem fim.

A dupla de artistas produz canções experimentais com toques de jazz, blues, MPB, rock, funk, e mesmo com a miscelânia de gêneros, o resultado não poderia chegar de forma mais harmoniosa para os ouvintes.

“Nós duas nos conhecemos na adolescência, e já tocamos juntas há 9 anos”, conta a banda sobre seu início em nota para o Mad Sound. “Começamos com outros projetos, e a Troá surgiu exatamente quando todas as bandas nas quais a gente tocava acabaram ao mesmo tempo, lá em 2015. Logo depois, a Manu foi substituir o irmão dela em um show no Pedro II, colégio da Carol, e esse show acabou sendo o primeiro da banda, porque seguimos com o trabalho a partir daí. Nessa época, a nossa formação era um pwr trio que só tocava cover, e dois anos depois, em 2017, começamos com o autoral, bem quando o Gabriel [Castilho] surgiu nas nossas vidas, então, ele chegou a tempo de desenvolver a identidade visual já do nosso primeiro single, que estava prestes a ser lançado.”

O EP Miolo, lançado em 2018 pelo duo, começou a se destacar no meio musical com ótimas faixas como “Vai” e “Você Vai Encontrar”, mas foi com o primeiro disco de inéditas da dupla, Eu Não Morreria Sem Dizer, de 2019, lançado via PWR Records, que Manu e Carol viraram as cabeças de todos de uma vez por todas.

O disco de 13 faixas traz parcerias com nomes como ÀIYÉ (Larissa Conforto), Chico Chico e Dedé Teicher, traz, na medida certa, profundidade e frescor na produção, sonoridade, e letras tão relacionáveis que chegam a ser cortantes, se tratando de proporcionar para o ouvinte uma verdedeira experiência através do álbum, exatamente o que a música sempre deve fazer.

A segunda faixa do disco “Você Me Dá Medo de Morrer Antes da Hora” já impressiona pelo intenso título, o que aumenta ao apertar o play e se agrava de vez ao assistir o recém-lançado clipe da canção, realizado através de uma colaboração entre Carolina e Gabriel, que segundo as artistas, é “uma parte intrínseca e entranhada da Troá, e tudo é pensado por nós três juntos. Foi em 2019 que nos consolidamos como um duo de mulheres instrumentistas, já com a sintonia de quase uma década de história, e combinada com a terceira parte, o audiovisual.”

“‘Você Me Dá Medo de Morrer Antes da Hora’ surgiu como um blues debochado e existencialista que a gente arranjou e compôs mais pro fim da produção do ENMSD, então a gente sente que ela tem mais a cara do álbum que muita coisa anterior. Misturamos o Blues com MPB, Ska sentimos que ela tem muita referência de Boogarins, Ventre, Letrux“, afirma a banda a respeito da faixa.

Já para o clipe, os artistas realizaram uma espécie de diários visuais entre 2018 e 2019 com a proposta de explorar diversos espaços quando ainda era possível estar inserido neles. “Com a liberdade que o cotidiano nos possibilitava entre 2018 e 2019, filmamos outra época das nossas vidas e do mundo, que acreditamos ter tomado outras formas e significados agora que boa parte de nós está vivendo um dia-a-dia drasticamente diferente”, diz a banda.

Em março, a banda também lançou uma nova faixa, a ótima “Bicho”, que teve uma inspiração um tanto curiosa e não tão poética como a maioria pode imaginar, revela a dupla. “‘Bicho’ tem uma vontade de usar o sarcasmo e as entrelinhas pra falar de uma coisa que incomoda. Ela foi escrita depois de eu ver um vídeo no Twitter, que era de um parasita colorido dominando um caramujo e se mexendo dentro dele. O desconforto desse vídeo me fez relacionar essa invasão a situações desconfortáveis que a gente vive no meio da música, e que talvez de cara ficassem muito pesadas de serem ditas, então, me inspirei numa linguagem bem despretensiosa. Eu compus ‘Bicho’ de um jeito bem parecido com o arranjo final, com a cabeça num bolero meio brega e os pés no rock, o que deu numa música divertida.”

Em tempos de incerteza sobre o futuro e o medo constante do presente, é inevitável a ansiedade não gritar mais alto e nos fazer questionar sobre o que podemos melhorar ou não deixar de fazer. E além disso, em um momento em que a existência dos artistas é colocada em xeque, o que a arte não pode morrer sem dizer?

“O que produzimos é nossa escolha de como viver uma vida ‘curta’ e que só acontece uma vez, e muito do ‘ENMSD’ vem daí. Existe dentro da gente uma urgência muito grande em transformar os sentimentos bons e ruins em movimento, tudo é aproveitado”, explica Troá sobre a questão. “No álbum pegamos a força de cada aspecto diferente das nossas vidas pra escrever e tocar sobre, e é por isso que ele tem tantas caras. Nos demos o desafio de falar de tudo que a gente não morreria sem dizer, ao mesmo tempo existir como mulheres instrumentistas, que é a nossa escolha política e individual pro resto da vida.”

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