Quatro mulheres unidas pela psicolodelia e pelo amor a música experimentam novas sonoridades enquanto lutam em uma cenário ainda dominado pelos homens. Este poderia ser o início da história de qualquer banda feminina, mas entre um grande leque na cena independente brasileira, uma se destaca: La Leuca.

Formado pelas irmãs Mariana Bonanomi (guitarra e voz) e Helena Bonanomi (guitarra e voz), ao lado de Dora Hoff (baixo) e Carolina Werutsky (bateria), o projeto de dream pop nasceu em Florianópolis, Santa Catarina em 2017. Buscando explorar a nostalgia da infância, elas lançaram o primeiro EP. Intitulado Dente de Leite, o trabalho traz quatro faixas inéditas que elas já apresentaram em todos os cantos do Brasil.

Juntas, já participaram de grandes festivais como o Winter Summer Fest em Curitiba em 2017, o Psicodália 2018, e o Festival Saravá 2018. Com pouco tempo de estrada, La Leuca já acompanhou bandas como Carne Doce, além de participar do SÊLA no Sul – produtora e criadora de conteúdo gerido apenas por mulheres que promovem shows e eventos com um lineup 100% feminino – e da edição especial do mês das mulheres do Sofar Sounds.

“Vou provar sua saliva / Com doce gosto / Amanhã já não repito / O alvoroço”, provoca La Leuca no single “Saliva Salina” que ao ser lançada, ganhou um gostoso e leve clipe delas se divertindo e curtindo um bom momento.

Com essa leveza que carregam, conversamos com Helena Bonanomi e ela nos contou um pouco sobre a jornada do grupo e o que as mantêm inspiradas. Leia nosso papo logo abaixo.

Mad Sound: Você pode nos contar um pouco da jornada até aqui?

Helena Bonanomi: Quando eu e a Dora [Hoff, baixista] estudávamos juntas no ensino médio tivemos a ideia junto de uma outra amiga de começar uma banda. Nesse começo éramos uma prática em conjunto, guiada pelo Carlos Lamarque (inclusive que inspirou a faixa “La Marque” do EP), eu, Dora e mais duas amigas. Mais tarde a Mari, que é minha irmã, entrou pra tocar guitarra. A gente tocava covers, mas acho que minha ideia nunca foi ficar aí, e comecei a levar composições minhas. A formação mudou algumas vezes e só ano passado chegou como está, com a Carol tocando bateria, com o nome de La Leuca, e com a intenção de ser uma banda autoral em que a gente se dedicasse de verdade.

MD: Quais são as dificuldades de fazer parte da cena independente aqui no Brasil? Principalmente sendo um grupo de mulheres.

HB: O fato é que lá fora rola mais público do que aqui, pois muitas vezes mesmo o que seria um possível público no Brasil ainda não aprendeu a olhar para dentro e valorizar o que tá rolando dentro do próprio país, muitas vezes até dentro da própria cidade, mas a gente espera que isso já esteja mudando. Isso sem contar que comprar equipamentos de música aqui no Brasil é algo muito menos acessível pra maioria do que na Europa ou nos Estados Unidos, por exemplo.

MD: Vocês já participaram do SÊLAR e outros projetos legais como o Sofar Sounds. Vocês acreditam que hoje há mais espaço pra mulheres nessa cena?

HB: De modo geral qualquer coisa que se faça como mulher em um meio em que predominam os homens vai ser uma dificuldade no sentido de que as pessoas não vão botar fé no que você faz de primeira. Muitas vezes a própria mulher não se sente capaz por falta de representatividade; é difícil você se visualizar em um palco em que quase não há outras mulheres, mas aos poucos a gente se acostuma e aprende a usar isso de uma maneira.

MD: Vocês trazem muita psicodelia e experimentalismo no trabalho. Como vocês se mantêm inspiradas e motivadas?

HB: Acho que essa inspiração pode vir do que a gente anda ouvindo no momento, e do que a gente vive. Mas mais do que isso, a música assim como qualquer fazer artístico de um modo geral não depende simplesmente de inspiração, mas como em outras profissões de um “sentar e fazer” que tem que ser cotidiano e persistente e muitas vezes independe da vontade, ou seja, parte mais do esforço do que de algo que vem de fora, como se romantiza muitas vezes ao se falar da vida de um artista.

MD: Como é o processo criativo de vocês?

HB: Normalmente eu ou a Mari levamos as letras, junto com melodia ou harmonia, ou só uma ideia de como a música vai soar; depois trabalhamos todas juntas o arranjo, e vamos moldando, encaixando e arredondando partes, em questão de horas ou dias.

MD: O EP Dente de Leite carrega uma dinâmica diferente. “Vai Ser” e “La Marque” são duas faixas diferentes e curtas que parecem muito o início das faixas que as sucedem. Como foi criar e expor o trabalho dessa forma? Teve alguma inspiração por trás disso?

HB: A gente tinha a ideia de colocar áudios de crianças pra criar um universo da temática da infância que o EP traz bastante; os interlúdios também criam esse universo, por que trazem uma conexão entre as músicas e deixa tudo mais amarrado, contando uma história.

MD: Vocês ja abriram pro Carne Doce, certo? Como foi a experiência?

HB: Foi terrível e maravilhoso (risos). É sempre difícil tocar pra gente que é inspiração, da nervosismo; mas claro que é muito bom e gratificante. Acho que são provas pra gente desmistificar esse tal mundo da música, ver que tá todo mundo ali tentando fazer dar certo, com sua trajetória única, e trocar experiências, principalmente.

MD: Hoje em dia vemos muitos artistas deixando de fazer shows dizendo que não vale a pena financeiramente ou até mesmo artisticamente. Como vocês enxergam isso?

HB: Acho isso relativo, tem que pesar muito as coisas. Às vezes é uma boa oportunidade mas que não é muito bem remunerada… São vários fatores que precisam ser vistos de várias perspectivas para o bem da banda. Muitas pessoas são a favor do “tocar de graça é melhor do que nada” e outras um pouco mais exigentes em relação a isso. A gente sempre costuma conversar e chegar num acordo que seja o melhor para o coletivo.

MD: Quais são suas inspirações musicais?

HB: Tudo que escutamos ou escutávamos nos inspira de certa forma, desde Boogarins e Carne Doce até Kelly Key, Palavra Cantada (risos). Nós quatro temos um gosto parecido, mas também apresentamos muitas coisas novas e diferentes umas às outras. Agora estamos querendo buscar um novo tipo de som e buscando novas referências pra crescer musicalmente.