A vida parece ser um constante trânsito: ela anda, para, às vezes para até demais, ou até flui inesperadamente. A única diferença é que o padrão temporal em que os sinais de trânsito operam, não acontecem na vida real, e o sinal verde, como já dizia Lorde, que estamos esperando e querendo, pode não aparecer tão fácil. E é sobre esse árduo trajeto que nem o mais avançado GPS pode prever para nós que Campeão da Avenida, terceiro álbum de Wagner Almeida, que foi lançado hoje, 22, pela Geração Perdida de Minas Gerais, nos convida à refletir sobre.

O disco, terceiro na discografia do artista, nasceu de uma natureza peculiar, mas agora, tantos meses depois, até que familiar: o isolamento da pandemia. O artista explica em entrevista ao Mad Sound que as músicas começaram a surgir de forma esporádica, e diferente dos álbuns anteriores, tais faixas resultarem em um disco foi algo não premeditado dese o ínicio. Além de canções criadas este ano, algumas que não entraram em projetos anteriores encontraram em Campeão da Avenida, o seu lugar.

O título e a capa partem de uma constante reflexão do artista sobre a vida em um grande centro urbana, no caso de Almeida, na capital Belo Horizonte. No entanto, ele comenta morar em uma área da cidade afastado do centro, passando um bom tempo em meios de transporte para chegar até compromissos, o fazendo refletir constantemente sobre o asfalto, os prédios, e todos os símbolos e características que compõem o urbano, e de certa forma, também fazem parte do sentimento de dúvida e desejo de vencer concretizando devaneios que devem resisdir constantemente ao olhar para fora de uma janela de ônibus.

No meio da jornada presente no disco, a faixa cinco “Perdoar” que conta com Theuzitz, não se trata da primeira participação do disco (essa fica por conta de Ana Paia em “Acordar”), mas foi a colaboração em que, segundo Wagner, o cantor convidado realmente teve um envolvimento processo criativo da faixa, compondo e adicionando elementos para a produção.

Segundo o artista, a música é a mais feliz do disco, mas por mais que a música seja animada sonoramente – as passagens sobre estar no karokê da liberdade cantando um hit da Pabllo Vittar nos fazem inevitavelmente sorrir e sentir a nostalgia da letra – os detalhes presentes na composição são memórias delicadas. “Perdoar” está em um ponto estratégico no álbum, simbolizando um ponto de transição em que a partir disso, as faixas se tornam um pouco mais melancólicas e um tanto quanto nebulosas.

“Eu falo abertamente sobre coisas que eu me sinto muito pouco seguro então pra mim acaba tendo uma quebra significativa”, ele conta sobre a segunda parte do álbum. Wagner também justifica a faixa que encerra o álbum, “Piloto Automático”, que deixa um gosto amargo na boca do ouvinte com os desejos do artista de ser uma pessoa mais otimista, no entanto, para ele, a canção – que foi criada em apenas um dia e caiu como uma luva para o disco – representa muito os sentimentos que ele enfrentou durante a produção de Campeão Na Avenida, e a grandiosidade progressiva presente na faixa cria um momento catártico digno de encerramento.

Durante esses meses apocalípticos, Wagner também fez parte da coletânia Rock Triste Contra o Coronavírus, iniciativa criada para ajudar o Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), e organizada por Vitor Brauer, da Lupe de Lupe, que é membro da Geração Perdida de Minas Gerais e masterizou o disco de Almeida, mas mesmo tendo essa proximidade com Brauer seu lado fã do artista é um tanto quanto considerável. E a veia da admiração sobre participar do projeto continua por estar ao lado de bandas que admira como Terno Rei e Tuyo, e é claro, usar sua arte para ajudar uma causa tão importante.

O sentimento de se sentir lisonejado na presença (mesmo que platônica) de artistas que são referências é algo bom, no entanto, tendo em vista as dúvidas presentes em Campeão da Avenida, Almeida eventualmente vai descobrir que a vida que parece ser um eterno sinal amarelo, sorri para ele emitindo uma intensa luz verde.