Depois de 10 anos desde a chegada arrebatadora do disco 21, já é unanimidade saber o que esperar de Adele: excelência. Com voz ressonante e letras carregadas de emoção e sentimentalismo, a cantora se tornou uma das poucas figuras que não precisam se envolver no jogo midiático para se manter relevante. Muito pelo contrário; a artista tem o hábito de tirar longos hiatos entre álbuns e ainda assim causar um frenesi quando anuncia um novo projeto. 

Com seu novo álbum, 30, não foi diferente. Em menos de vinte e quatro horas após o lançamento, todas as faixas do disco já tinham dominado o Top 13 do Spotify estadunidense. A pedido seu, o próprio Spotify modificou uma de suas funções mais controversas, retirando a função aleatória como opção padrão de reprodução dos álbuns da plataforma. “Nossa arte conta uma história e nossas histórias deveriam ser ouvidas do modo que nós planejamos,” escreveu Adele em seu Twitter.

Seu quarto álbum de estúdio conta uma história mais íntima e dolorosa que qualquer outra contada anteriormente. Agora com 33 anos, Adele revisita os capítulos turbulentos da sua vida pós-divórcio, quando tentava lidar com a solidão, aceitar suas escolhas, reencontrar sua identidade e cuidar do filho pequeno, Angelo, hoje com nove anos de idade. É dedicada a ele não só a faixa “My Little Love”, que reproduz a gravação de uma conversa entre mãe e filho, mas também o 30 em sua totalidade – claro, quando o garoto for grande o bastante para compreender.

Compreender o novo álbum de Adele não é uma tarefa que será cumprida por todos. 30 é um disco maduro, feito intencionalmente para as pessoas da mesma faixa etária de Adele que estão passando ou já passaram por experiências semelhantes. Metade de suas faixas ultrapassa os seis minutos de duração e as canções possuem uma construção clássica e à moda antiga, em sua grande maioria conduzidas pelo piano. A faixa de abertura “Strangers By Nature” soa como a trilha sonora de um dos antigos clássicos da Disney, nos convidando a uma terra mágica, sonhadora e afastada do tempo.

Completamente despida de grandes refrões, arranjos manjados e fórmulas de sucesso para as rádios, o novo trabalho de Adele em pouco se assemelha com grandes hits populares como “Rolling In The Deep” e “Hello”. Seu single de retorno foi a delicada “Easy On Me”, de longe trazendo uma levada mais introspectiva e menos grandiosa que suas músicas de trabalho anteriores. A explicação, nas palavras da cantora, é simples: “Se todo mundo está fazendo música para o TikTok, quem está fazendo música para a minha geração?”

Em 30, Adele foge do imediatismo e da previsibilidade da música pop atual e mostra seu lado romântico e tradicional. A artista traz inúmeras referências da música dos anos 50 para seu trabalho, como sua voz intercalada em camadas para formar os backing vocals da energizante “Cry Your Heart Out” e a composição instrumental do falecido pianista de jazz Errol Garner em “All Night Parking”, a primeira colaboração da carreira da cantora. Suas inclinações para o pop se mostram mais evidentes nas contagiantes “Oh My God” e “Can I Get It”, que se mostram mais palatáveis para as rádios populares.

Os 58 minutos de 30 não são para aqueles de nós que cresceram ouvindo o som mastigado do mainstream. No disco mais pessoal de sua carreira, Adele resgata as referências musicais que influenciaram sua vida e escreve uma obra feita para si e para os seus; um disco a ser degustado e apreciado com atenção, especialmente em suas faixas mais longas que em nenhum momento usam artifícios para distrair o ouvinte ou desviar sua atenção daquilo que está sendo dito. Todos são bem-vindos a entrar na terra de 30, mas muitos de nós ainda precisam de alguns anos de estrada para compreender a jornada.

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