O que você enxerga ao olhar pela janela? Independente de encontrar uma paisagem rural ou urbana, é certo que você pode estar um pouco cansado de encarar as características de sua vizinhança devido ao isolamento do último um ano e meio. E apesar das pessoas falarem que podemos achar beleza nas coisas simples, nunca ouvi comentarem sobre achar beleza na repetição e na visão de ver o mundo se manter o mesmo enquanto mudamos tanto aqui dentro. 

São dessas e outras falhas, surpresas e mudanças no concreto que o trio carioca Aquino e a Orquestra Invisível narram em seu primeiro disco, o já maduro e ao mesmo passo vulnerável e íntimo Os Prédios Cinzas e Brancos da Av. Maracanã, que com uma sonoridade sofisticada de músicos dedicados, mas com as dúvidas e esperanças da nova geração de jovens artistas brasileiros, convida todos (inclusive o Mad Sound, em uma entrevista inédita) a repensar e celebrar suas mudanças, destruir seus muros, e construir novas pontes, tudo sem sair de nossos fortes.

Mad Sound: Meninos, eu adorei o disco! Achei um conjunto de referências tão ricas ao som do MPB, samba e do indie, mas com um toque de vocês muito íntegro, singular. Com isso, fiquei curiosa em saber cronologicamente como esse projeto nasceu, suas fases no sentido de como ele iria soar, do que ele iria falar, as questões visuais…

Aquino e a Orquestra Invisível: Pétala, obrigado demais por estar recebendo a gente aqui no Mad Sound! E que bom que você gostou do disco, foi um processo muito íntimo e doido pra gente. A história começa quando o [João] Soto e o [João] Vazquez se conheceram ainda na escola (lá pra 2017) e foram descobrindo muita música brasileira. A partir daí, as primeiras composições foram surgindo e um imaginário de um trabalho mais sólido começou a nascer. Em 2019, conhecemos o Leandro [Bessa] e formamos oficialmente a Aquino, já começando a ir pro estúdio produzir as músicas. A ideia sempre foi fazer um álbum, acho que a gente como músico tem esse imaginário romântico com fazer um disco, de colocar uma obra no mundo, e foi isso que a gente fez. Em 2020 lançamos nossos primeiros singles e em 2021 esse álbum que vai ser pra sempre nosso xodózinho.

Sobre a sonoridade, a ideia sempre foi respeitar o que cada música pede, sem essa ideia de se prender em um estilo musical só. Acho que por isso que conseguimos ir para tantos lugares sonoramente nesse trabalho, onde a estética sonora é não se apegar na nossa zona de conforto. Experimentamos demais e foi ótimo pra nossa evolução como artistas.

Na questão visual, sempre tivemos em mente essa questão dos contrastes e da relação com o tema do disco em si. A ideia foi com cada single trazer uma cor nova que somasse na palheta desse trabalho colorido e ao mesmo tempo super sóbrio. No disco, trabalhamos muito os tons de cinza pra representar a atmosfera que a gente queria criar pros ouvintes. No final tudo encaixou e tem sido ótimo ver o significado individual que cada pessoa tem do produto final.

MS: Eu moro em São Paulo, mas antes de morar aqui, eu estava longe e sentia muita falta de ver os prédios da cidade, principalmente de noite quando todos estão iluminados. Mas as pessoas sempre me julgavam por achar prédios bonitos e de certa forma ver que eles representavam muita coisa no cenário urbano mesmo. Mas vocês estão no meu time, e usaram essa visão cotidiana como inspiração para o disco. Quando e como vocês perceberam que essa “paisagem cinza” poderia dizer muito?

AOI: Acho que essa questão com a cidade é algo que coexiste com todo mundo que cresce neste mundo de concreto, muito barulhento e ao mesmo tempo aconchegante. Na nossa opinião tem a ver com uma identificação e um conformismo com esse lugar comum de criação. Não tem como não ter uma memória afetiva com um lugar que você vê todo dia, que você viveu tanta coisa, quebrou a cara por alguém, conheceu gente, tem memórias boas e ruins. Acho que a mensagem do disco é que tem beleza em todas as coisas, nos momentos ruins e nos bons e, querendo ou não, não tem representação melhor pra essa dicotomia do que a cidade. E a gente sente saudade, né? É de onde a gente veio, não tem como fugir.

Acho que outro aspecto peculiar do disco é tratar, também, as características da [Barra da] Tijuca, lugar no qual o álbum se passa. Ao mesmo tempo que é uma super massaroca de concreto, temos acesso direto a um dos maiores parques florestais do Brasil, e essa proximidade com a natureza num ambiente tão estéril também cria muito lugar pro pensamento poético.

MS: Uma contradição curiosa é o nome da banda ter “Orquestra Invisível” no nome sendo que diversas faixas tem um som de arranjos fantásticos. Qual é a importância desse som nas canções de vocês? 

AOI: Engraçado você perguntar isso porque o “Orquestra Invisível” foi justamente o que veio por último no nome da banda. A gente tava no estúdio fazendo os arranjos e pensamos: “pra reproduzir ao vivo só com uma orquestra invisível”. No começo era uma piada, mas com o tempo fez mais e mais sentido somar esse posto no nome Aquino, justamente pelo papel que essa orquestra invisível foi tomando nos processos. A gente ama fazer arranjo e esse disco foi tudo muito megalomaníaco, muito graças a genialidade do nosso produtor Sidney Sohn Jr, que conseguiu pegar nossas ideias e junto com a gente transformar em realidade. O resultado a gente ama de paixão, e o nome da banda fez cada vez mais sentido.

MS: Gosto muito de capas mais minimalistas, mas que você tem o suficiente para analisar e sentir a temática que o projeto traz. E acho que a capa do disco faz isso muito bem. Como surgiu a ideia da capa pensando no conceito do projeto? 

AOI: A ideia surgiu lá em 2018, quando a gente ainda tava embrionando o que viria ser o disco. O nome Os Prédios Cinzas e Brancos da Av. Maracanã já existia antes da música, então a gente tinha ideia de qual seria a temática do projeto. Aí, o Vazquez pensou em usar a janela do quarto do Soto, onde é o 302, pra representar esse imaginário tão conhecido pra gente. Essa ideia da janela cheia de plantas, ela sumariza muito o que a gente queria passar. Só uma foto, sem texto, sem título, misturando o concreto com essa natureza domesticada nos vasos, que da essa impressão das florestas de apartamento, esse lugar criado pelas pessoas pra se sentirem mais próximos da terra. A capa também está dentro da relação com os singles coloridos, sendo ela o branco, a falta da cor, a tela vazia. A gente aproveitou essa tela pra colorir do jeito que a gente queria, e saiu esse nosso primeiro disco, com acerto, com erro, mas principalmente com a gente. Não tem como ficar mais feliz.

MS: Após o lançamento do disco, o que o público pode esperar de novidades da banda? 

AOI: Depois desse lançamento a gente tá tirando um tempo pra elaborar os novos caminhos a partir de agora. Ja já temos uma surpresa envolvendo ainda esse projeto “Prédios”, uma extensão final desse disco que a gente amou tanto fazer. Depois disso, vamos continuar fazendo o que a gente ama, que é fazer música junto, criar discos, criar arranjos. Pra gente o que importa é tar junto e tar bem, evoluindo e se descobrindo cada vez mais como artistas. A gente espera poder rodar e fazer shows assim que for liberado, já estamos morrendo de ansiedade. Quem sabe já já a gente se vê 🙂

E obrigado demais pelo papo, a gente amou falar um pouco mais sobre esse disco que mudou nossa vida.

Ouça agora Os Prédios Cinzas e Brancos da Av. Maracanã: 

LEIA TAMBÉM: Thiago Elniño vira ‘Correnteza’ para sobreviver em novo disco