Nos últimos anos, raras são as pessoas ao nosso redor que não se encontraram em um constante ciclo vicioso que vai da ansiedade, pessimismo e, de vez em quando, um tímido raio de esperança. Tal desastablizante e intenso processo é abordado com maestria pelos sorocabanos do WRY, no álbum Noites Infinitas, lançado na última sexta, 30, via OAR, selo norte-americano que é casa de nomes como Boogarins e Winter.

No primeiro disco da banda em onze anos, e o sexto da discografia do grupo, que possui 25 anos de muita história, o percurso das composições frutos desses sentimentos e realidades que resultaram em música percorre o caminho da banda desde 2017. A vida (com certeza) pode não ter ficado mais fácil, mas a banda com certeza traz no novo projeto um amadurecimento e clareza da própria arte. “Eu acho que temos mais consciência do que queremos, a ideia formada na cabeça parece mais clara e a execução dessa ideia parece mais precisa e mais fácil de se transformar no estúdio. Em 2017 a gente também estudou música, como nunca tínhamos feito, e isso facilitou também o processo criativo, parece que a cabeça abriu. Tipo, juntamos aquilo que adquirimos da experiência, mais o que aprendemos em um ano de estudo, prático e teórico, planejamos o que queríamos fazer e executamos”, compartilha o vocalista Mario Bross em entrevista ao Mad Sound.

A sonoridade do sucessor de She Science, de 2009, varia do post-punk ao shoegaze e até o eletrônico, e tem como referência, segundo o vocalista, nomes atuais como The Vaccines, Fontaines D.C, Idles, Tame Impala, Unknown Mortal Orchestra entre outros, mas também trazem nos sintetizadores e atmosfera nostalgica, inspirações do passado como The Cure, The Clash, e Joy Division, abraça as composições precisas que despertam os sentimentos confusos da juventude em meio à verdadeiros anos apocalípticos e decisivos no âmbito político e ameaça da censura e sucateamento cultural no Brasil, e na própria cidade-natal da banda, Sorocaba, no interior de São Paulo, tomada pelo nítido conservadorismo desde o apoio de uma parte da população ao atual Presidente nas últimas eleições.

Apesar da aparente interminável preocupação e decepção com o país, a banda é uma verdadeira cidadã do mundo e traz esse traço no projeto como visto nas influências sonoras, nas canções que alternam entre o português e o inglês, e na passagem e até residência de palcos urbanos e de festivais pelo mundo. A banda morou em Londres por quase dez anos, reconhecendo, segundo Mario, os atributos da capital para qualquer artista em busca de oportunidades. Já na bagagem de shows que ficarão na memória do grupo a lista parece ser interminável, e não é por menos. “O palco do KOKO em Londres, aquele show está marcado para sempre. Outro de Londres, pequeno mas muito importante, o palco do Buffalo Bar, de inúmeros shows, mas um em particular, o do dia 16 de maio de 2008, quando o My Bloody Valentine estava nos vendo. Um que nunca vou esquecer também é um de 2019 que fizemos no palco do CCSP. Inesquecível! O número de stories que nos marcaram naquele dia foi impressionante também, hehehe.”

“Foram muitos, estou pensando aqui aleatoriamente, mas lembro do show que fizemos na Virada SP no palco Dia da Música, no Razzmatazz; palco virado pra rua, e a rua completamente tomada. A gente fez um showzaço naquela noite também. Foi em 2015, tinhamos acabado de voltar de alguns shows que fizemos pela Inglaterra, Portugal e no Primavera Sound na Espanha!”, Mario relembra.

O crescimento de uma banda que nunca parou de almejar as estrelas ao inovar, aprender e expandir sua arte, contrasta e muito com o retrocesso da realidade em que vivemos. O barulho desse conflito, presente em Noites Infinitas, é singular, alternando entre o barulho dentro de uma cabeça perturbada pelo externo, o desejo de silêncio do interno, e o som da incansável faísca da esperança.

Ouça abaixo Noites Infinitas, do WRY.

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