Como uma expansão de seu universo musical, Vovô Bebê apresenta BAD ENGLISH, novo álbum lançado em abril de 2025, mas com influências, nuances de linguagem e trocas culturais de 2020 – ano de composição e gravação. Criado para cada canção ser uma viagem sonora, o disco conta com o produtor musical Chico Neves e uma equipe calibrada de músicos, incluindo Ana Frango Elétrico, Guilherme Lírio e Biel Basile.
Em entrevista ao Mad Sound, o compositor, arranjador, produtor carioca e artista por trás do projeto, Pedro Dias Carneiro, fala sobre o novo álbum, influências e os planos futuros da carreira.
Junto com a entrevista, Vovô Bebê apresenta o videoclipe da faixa “Forest Baby”, que você confere com exclusividade no Mad Sound.
MS: Seu novo álbum, BAD ENGLISH, é composto sobre a estética do rock e as suas referências e memórias em sua juventude nos anos 90. Como as músicas refletem essa sua nostalgia?
Vovô Bebê: Acho que ela reflete mais uma coisa de estética, é menos uma coisa direta, de exatamente como soava. Na hora de produzir, de compor as músicas, não foi uma coisa tão consciente, mas foi se revelando assim durante o caminho. E também, o fato do Chico Neves ser um produtor que foi muito relevante nessa época, fez parte dessa estética na época, de discos, muito dessa época, acho que isso ele trouxe também.
E acho que o fato de na hora de fazer os arranjos, eu não inventei muita moda, não sei se isso tem a ver com a estética dos anos 90, mas pra mim, em algum lugar, talvez por eu ser jovem na época, sabe? Na época que eu era jovem, eu tinha essa coisa um pouco mais… uma abordagem mais inocente com as músicas. Acho que tem a ver com isso.
MS: O disco não reproduz exatamente o rock dos anos 90. Como foi o processo de composição e quais foram suas principais inspirações?
Vovô Bebê: Eu nunca tinha feito nenhuma música em inglês e tinha uma amiga minha que ia gravar um álbum em inglês fora do Brasil e ela me contou isso. E eu falei, ‘Ah, vamos tentar compor música em inglês pra você’, como se fosse uma primeira coisa, só que eu fiz uma e ela adorou. Eu comecei a fazer várias. Mas na verdade nenhuma ela gravou ainda.
Mas ao mesmo tempo, eu fiz também uma música, meio de humor. A primeira que eu fiz foi “Star Smoke Sucker”, que era uma brincadeira com uma outra amiga minha. Acho que foi um jeito de também abrir umas outras portinhas no meu próprio inconsciente, através da linguagem, porque eu, na hora que eu componho, acho que eu fico muito à vontade, eu acho que como é em outra língua me leva para um outro jeito de pensar. Isso que teve mais a ver no processo de composição porque a gente consegue teorizar em cima, mas na hora foi mais intuitivo do que uma coisa muito pensada.
MS: Durante a audição, percebi em algumas canções tons da tropicália, disco music, e do rock progressivo nacional. Essas vertentes também foram uma inspiração?
Vovô Bebê: Eu sinto que não diretamente, mas só que tudo com certeza indiretamente. Por exemplo, disco music, que você falou mais especificamente, na “Star Smoke Sucker”, ela era outra coisa. Então, a Ana Frango Elétrico, que participou do disco, na hora falou, ‘Essa música podia ser meio disco music’. Essa foi a influência disco music que o disco teve. A gente fez a batida, ficou legal, foi isso. Não foi uma coisa pensada. E o rock nacional, acho que é isso. O fato de ser um disco de guitarra, baixo e bateria, tem synths e teclados. É uma coisa que eu acho que realmente aconteceu, que especificamente na época, era legal soar num caminho parecido com o Odelay do Beck, que é um disco que mais diretamente a gente pensou na hora da produção.
MS: Sobre a escolha do nome do novo disco, BAD ENGLISH, qual sua intenção e a mensagem que quis passar?
Vovô Bebê: Uma coisa bem óbvia do meu inglês não ser dos melhores do mundo, então é quase como uma desculpa de antemão. É uma brincadeira, uma desculpa. Acho que tem várias outras possíveis interpretações, mas eu fiz com o meu inglês ruim, “bad english”, é isso. E também se você for prestar atenção nos assuntos, tem uns assuntos um pouco mais obscuros. Mas tem outros jeitos de pensar isso que eu acho interessante também.
MS: As canções soam despojadas, sem preocupação em perfeição, tanto no instrumental quanto nas letras. Qual era sua intenção quando você estava construindo o som dessas músicas?
Vovô Bebê: Acho que é mais uma coisa de valorizar as primeiras ideias, os primeiros impulsos. Por exemplo, eu toco uma música no violão pra você, sabe o jeito que você balança a cabeça com essa música? Eu tenho outros discos que tem umas coisas um pouco mais complexas, eu acho que tem muitos músicos, amigos que acham que eu vou querer um arranjo doideira sempre. Mas nesse disco eu quis captar meio que esses primeiros impulsos dos músicos. Eu mostrei as músicas, não quis fazer muito arranjo antes, a gente se reuniu no estúdio, eu mostrei pra galera. Não fiquei muito rodando lâmpada com isso, mas óbvio que a gente queria soar bem. Isso não quer dizer desapego no sentido de ‘Dane-se o que a gente tava fazendo’. Eu queria a musicalidade mais direta mesmo. Mas dentro disso eu sei que as minhas coisas às vezes já são meio esquisitas, eu queria não botar mais uma camada de esquisitice na coisa.
MS: Como foi a colaboração com a banda formada por Ana Frango Elétrico, Guilherme Lírio e Biel Basile?
Vovô Bebê: A Ana e o Gui são meus amigos e colaboradores há muito tempo. Toco com a Ana desde o início, agora não tô mais na banda, mas a gente é colaborador há muito tempo. Ela participou de vários discos meus e o Gui também. O Biel foi a primeira vez. Na pandemia eu fiz um disco à distância e fiquei procurando gente que tinha esquema de gravação em casa. E o Biel, a gente já estava flertando musicalmente. Ele foi em um show meu, e eu fui em um show do Terno. E ele gravou a bateria para mim à distância no disco Lixas Vários Tipos, no final de 2020. E na hora de gravar esse, ele tinha um som muito bonito, muito pronto da bateria. Então eu chamei esses três. A Aninha na guitarra e teclados, o Gui no baixo e o Biel na bateria.
O Chico também. Foi tudo muito pensado, porque a gente gravou em 2021 e ainda estava naquele esquema não tão aberto. Chico mora no meio do mato com a família dele, então a gente tinha que ficar um tempo em isolamento para fazer teste antes de ir, então foi bem aquela coisa, um tempo sem fazer nada, ficamos uma semana lá e gravamos.
MS: Algo curioso no seu projeto é seu nome artístico, Vovô Bebê. De onde surgiu essa ideia para o nome?
Vovô Bebê: Tem algumas respostas também para essa pergunta. A que eu mais gosto é que “Vovô Bebê” era uma música que eu fiz em 2007. Era uma música que une essas duas pontas da vida. O hospital, as coisas que têm em comum entre o vovô e o bebê. A necessidade de cuidado, ao mesmo tempo uma sabedoria meio ancestral que vem no neném, assim que você olha na carinha dele, mas ao mesmo tempo tá ali precisando de cuidado.
É todas essas coisas em comum dessas duas pontas da vida. Essa música virou o nome do meu primeiro disco. Na época eu não tinha redes sociais, e na hora de fazer eu estava com o discurso de ‘Eu não vou fazer redes sociais do Pedro, eu vou fazer redes sociais do Vovô Bebê’. Hoje em dia, as pessoas só querem saber do artista e não da arte. Então fiz as redes sociais do disco Vovô Bebê. Então, as pessoas começaram a me chamar de Vovô Bebê. Obviamente. E no segundo disco eu já assumi essa persona e virou o nome artístico.
A melhor resposta é essa. Vovô Bebê era o nome de uma música, virou o nome do disco, depois virou o nome do artista. Agora está virando uma praça aqui. De repente, vai virar uma cidade, quem sabe um país. Daqui a pouco todos nós seremos Vovô Bebê.
MS: Como você vê a indústria musical atual? Quais são os desafios e oportunidades para artistas independentes?
Vovô Bebê: Eu não me sinto uma pessoa tão preparada para essa resposta. Eu me sinto meio operário da música, eu fico o meu dia a dia inteiro trabalhando em várias funções diferentes na música e percebo muitos desafios. Eu me sinto privilegiado de conseguir trabalhar com isso, então não é um desafio. Essa pergunta tem muitos aspectos. Tem aspectos sociais e artísticos.
Eu acho que é muito desafiador você conseguir ter uma carreira digna e viver dignamente, fazendo só sua música. Eu não conseguiria, de forma nenhuma, pagar minhas contas só com o Vovô Bebê. Eu pago minhas contas sendo várias outras coisas. Ninguém ouve meu disco, tem uma meia dúzia de pessoas que ouvem, tem uns músicos que gostam, e aí eu arrumo trabalho. As pessoas me chamam pra trabalhar, pra gravar, pra tocar. Trabalho em estúdio, sou técnico de som, faço arranjo.
Esse é o meu desafio, mas essa é a minha história. Eu acho que são muitos desafios para pessoas diferentes, de lugares diferentes. Dependendo de onde você está, quanto mais longe dos centros. Tem muitas questões. Então eu não tenho muito o que reclamar, porque eu consigo viver dignamente.
Agora, oportunidades… Isso é difícil. Não sei se tem tantas. Tem que ter muito sangue nos olhos pra fazer o negócio virar. Eu costumo dizer que a carreira da música independente é como se você estivesse empurrando uma geladeira numa ladeira. Tem que fazer muito esforço pra ela subir. E se tu largar um pouquinho, ela desliza.
MS: Você vê desafios na composição de um novo disco, como a concorrência, a pressão do mercado e a necessidade de se reinventar?
Vovô Bebê: Acho que o tempo todo. Mas eu sinto, por essa coisa de eu ter conseguido achar um lugar na minha vida pessoal, eu consigo viver trabalhando com música, mas não necessariamente tem essa pressão em cima do meu projeto musical. Ninguém está esperando eu fazer nada. Eu posso fazer o que eu quiser na minha música. Especificamente quando eu vou compor, é o lugar onde eu tenho conseguido me manter muito livre. Eu até gostaria que isso mudasse, que as pessoas ouvissem e eu pudesse te responder sobre essa pressão de me reinventar, mas eu não tenho essa pressão exatamente porque me coloco nesse lugar. Mas eu, pessoalmente, gosto de manter isso vivo.
MS: A arte da capa de BAD ENGLISH lembra o último disco de David Bowie, ‘Blackstar’. Tem alguma referência ou inspiração nesse caso?
Vovô Bebê: A arte é da Maria Call e da Ana Frango, elas duas fizeram juntas. Eu deixei muito na mão delas. Eu não sei se elas tiveram essa referência, talvez. Boa pergunta. Mas eu não tive. Na verdade, pra mim foi muito diferente até das outras vezes. Em geral, se você for ver minhas capas, elas são um pouco mais caóticas. Tem um significado ali que tem a ver com o disco. Se você for ver nas letras, aparece a lua, a estrela, é uma coisa meio obscura, ao mesmo tempo meio minimalista.
MS: Quais os planos futuros do projeto Vovô Bebê?
Vovô Bebê: Tem planos de show pra esse disco em setembro, Estou tentando montar uma pequena turnê. Esse disco me deu muita vontade de fazer um disco novo em português. Porque tem uma coisa, uma vez que eu fui tocar em um lugar e eu fiquei pensando, tem um certo carisma nos shows que tem a ver com letra também. E às vezes eu sinto que cantar em inglês me distancia de algumas pessoas. Eu nunca fiz um disco em inglês, estou empolgado. Vou tocar porque eu adoro esse disco, mas eu estou com vontade de me comunicar com as pessoas que estão aqui do meu lado, e inglês, muita gente fala, mas muita gente não fala.
Eu também estou fazendo um disco só de violão. São essas duas coisas que estão apontadas para o Vovô Bebê nos próximos meses, talvez esse ano ainda.