Um dos maiores nomes para se ficar de olho atualmente, a banda de rock brasileiro A Olívia lançou em julho seu segundo álbum de estúdio, Obrigado Por Perguntar. O lançamento, que já vinha sendo antecipado desde o primeiro single “Hasta Luego”, marca uma nova fase do grupo, cada vez mais atrelado ao pop rock brasileiro e às questões globais. 

As 13 faixas que compõem o álbum passeiam por diversos estilos, com influências de punk, reggae, indie, pop e até o hardcore. Tudo isso sem perder as características marcantes da banda, que aposta em canções de amor, letras poéticas e bem humoradas, e refrões carregados de fúria e inconformismo.

Conversamos com Louis Vidall (vocal e guitarra) e Pedro Tiepolo (baixo) sobre os temas abordados no novo álbum, a visão de mundo d’A Olívia e o diferencial de suas músicas. Confira na íntegra:


Mad Sound: Vamos falar sobre Obrigado Por Perguntar. Quais você diria que são as maiores diferenças entre esse projeto e o Jardineiros de Concreto, que foi o álbum de estreia de vocês em 2017?

Louis Vidall: Acho que tem uma diferença de produção musical e técnica. Aquele era nosso álbum de estreia, então a gente melhorou como banda. Também aprendemos aonde pôr energia, onde pôr dinheiro, estúdios, tudo isso a gente deu um salto bem legal. O produtor, Kaneo Ramos. O mixer e master, Zeca Lemos. E em relação à importância do teclado também nesse álbum. Jardineiros de Concreto é um álbum que o teclado começa a dar um oi, mas aqui a gente tem muito mais teclado, muito mais voz, muito mais coro.

Em relação à temática, Jardineiros de Concreto tinha uma onda muito de personagens. Tinha Bartolomeu, Dorinha, tinha um universo que passava pela cidade – por isso o nome Jardineiros de Concreto – mas era uma coisa mais caracterizada. Obrigado Por Perguntar eu acho que é uma coisa mais global, mais coletiva, sobre o ponto de vista de uma pessoa ou de uma banda, mas é um ponto de vista no meio de tantos. E acho que Jardineiros de Concreto era vários pontos de vista no meio de uma loucura. Os dois falam de cotidiano, só que de jeitos diferentes.

MS: Um dos maiores diferenciais d’A Olivia, na minha opinião, são justamente os temas que vocês abordam nas músicas de vocês. Vocês gostam de falar sobre assuntos globais, gostam de fazer críticas políticas, gostam de deixar suas visões políticas nas músicas, gostam de comentar pautas sociais, de refletir sobre as coisas que estão acontecendo no mundo. De onde que vem a decisão de abordar esses assuntos?

LV: Eu brinco que eu tenho uma alma mais punk. Eu não tô no clube dos punks, mas eu tenho uma alma mais punk. Isso passa muito pela minha infância, pelos amigos que eu tive de afinidade sonora, e eu sempre gostei de me colocar em contato com as coisas. Quando eu tava lá no começo de faculdade, para mim um rolê não existia outra opção sem ser metrô e andar para caramba. Quanto mais longe melhor porque eu conheço outro buraco da cidade. Estar em contato com as coisas. Acho que ter morado ali em Mairiporã também me moldou bastante porque é uma cidade onde não tem muito fácil acesso, não tem trem, por exemplo, então eu tinha muitos momentos de ficar em casa com meus amigos ali do bairro e quando ia para São Paulo era uma intensidade.

Quando você mora mais no “interior”, você conversa com geral, você joga bola com todo mundo, você troca ideia com várias classes e várias pessoas diferentes, e você vai entendendo que se você não se põe em contato… Agora uma coisa mais “caxias”; uma vez tinha uma palestra na faculdade – porque eu queria ser redator – e um redator de alguma agência grande falou isso: Vocês querem ser redatores, vocês querem falar para o Brasil, vocês precisam estar na rua, precisam estar em contato com as coisas. Eu procuro estar em contato e falar além do umbigo porque eu acho que tem mais graça, traz mais significados e mais ambiguidade também. Porque [quando] você fala de você, você tem uma certeza ou uma incerteza de você. [Quando] você fala do resto, você não tem certeza de muita coisa, né?

Pedro Tiepolo: Acho que nos dois álbuns e também nos últimos EPs que a gente lançou sempre teve essa temática dessas questões sociais e globais, mas o Louis consegue trazer para o lado pessoal, tipo em “Lobo Guará”. Acaba sendo nem um tema pessoal e nem global, é mais a relação da pessoa com essa questão maior. Até mesmo “Insustentável”, que podia ser uma coisa muito “Precisamos salvar o meio ambiente”, mas eu acho que ele traz isso de um jeito mais falando como a pessoa se sente diante disso. E do outro lado também. Mesmo as músicas que poderiam ser muito uma música de amor mais direta, eu acho que do jeito que ele traz, vira uma música de amor diante de todas essas questões no mundo.

MS: Tem algumas músicas que tiveram um processo de composição mais marcante pra vocês do que outras?

LV: Eu adoro “Histórias Que Não Escrevi”, que é uma parceria minha e do Pedrinho. A história é: ele sempre tocava uns riffs de baixo no meio do ensaio e eu já sacando que ele tinha alguma coisa, mas não tava mostrando. Aí eu falei: “Me manda isso daí tá legal”. Na semana em que ele manda, eu começo a pensar em harmonia, mas eu não sabia do que que era a música. É um pouco mais difícil quando você vai fazer parceria. Aí na mesma semana, eu entrei em contato com outro amigo meu e fiquei sabendo que um rapper que a gente fez umas parcerias em uma época tinha falecido em um acidente e aquilo mexeu muito comigo porque rapper normalmente tem essa história de ser um cara que é sonhador, que vai, escreve, faz o corre dele. Aí eu pensei nele e fiz essa música sobre “as histórias que não escrevi”. 

E eu gosto muito porque o Pedrinho nunca conheceu o Nego, né? Então tem essa ponte que eu percebi só com essa música, que é uma ponte que a música é capaz de fazer, que é, por exemplo, eu, o Pedrinho e o Nego estamos eternizados numa parada que não era pra acontecer, que nem o Pedrinho conhece, nem o Nenê conhece, mas que tá rolando. Então, tem essas tristes ou felizes coincidências no meio do processo criativo que fogem um pouco dessa coisa mais conceitual, mais cabeçuda.

MS: Vocês são uma banda que também amadureceu muito musicalmente ao longo dos anos. Quais são as principais influências de vocês hoje em dia?

PT: A gente sempre tem dificuldade de se auto-definir e falar que tipo de som a gente faz. Porque “indie” parece meio limitante, mas mesmo “rock” também pode ser muito variado e pode passar a ideia de que a gente veste preto e faz um som muito pesado, o que não é necessariamente o caso.

Hoje, como tem 5 pessoas na banda, cada um tem suas influências, mas acho que a gente conseguiu achar uma coisa em comum que é a sonoridade da Olivia. A gente define meio genericamente como “rock brasileiro”, o que eu acho legal porque “rock” pode ser várias coisas, mas com essa pegada meio brasileira no sentido de ter uma sonoridade bem nacional.

LV: Que vem do [EP] Selva Rock também, né? O Selva Rock foi um jeito da gente falar “Vamos achar algo que é quase um estilo nosso”. A gente não sai falando que a gente faz selva rock, mas é algo pra gente se alimentar da gente mesmo. Tem umas bandas que nós todos gostamos, como Queens of Stone Age, Beatles, Red Hot Chili Pepper, Foo Fighters. Talking Heads é uma banda que eu acho que todo mundo gosta bastante. 

PT: De coisas nacionais, Paralamas do Sucesso. O único cover que a gente faz de vez em quando é do Paralamas. Tem bandas pontuais que todo mundo gosta, mas é difícil pra gente achar uma coisa específica que a gente fale, “Ah, essa banda é claramente uma influência grande pra banda” porque é isso: a gente começou, mas agora a maior referência pra gente é A Olívia.

MS: Qual é a mensagem principal que vocês gostariam de passar com o Obrigado Por Perguntar?

LV: Eu acho que “Ensaio Aberto” é um bom ponto de partida porque é sobre se abrir, abrir seu universo particular com outra pessoa, ficar vulnerável, mas falar sobre coisas bonitas e também interessantes, também “fora da caixa”. A gente quer passar essa mensagem meio otimista, mas também vendo os problemas do mundo. O planeta tá pegando fogo, mas se não houver esse reencanto pelas coisas, se pra ter um papo interessante tem que ser um papo sempre muito firme, muito embasado, eu acho que perde o charme.

Tem que ter um lance mais apaixonado pela vida porque se falar só do próprio mundo não resolve, reclamar só do mundo alheio não resolve. Também uma coisa meio Rita Lee, “O que foi que aconteceu com a música popular brasileira?”. O rock é e sempre foi para ser divertido. Sempre foi para ser contestador mas sempre foi para se mexer, abrir a cabeça, não pra ficar no palco assim só para você mesmo. Um amigo meu esses dias compartilhou o álbum e falou que ele acha que uma das maiores virtudes [d’A Olívia] é ser uma banda e um álbum meio que anti-blasé e eu acho que isso é muito da nossa vibe mesmo. Na Olivia, todos nós somos muito transparentes e a gente não tem esse hábito do blasésismo e eu quase que não suporto isso, acho uma perda de tempo. Então acho que tem essa coisa meio vamos deixar o blasé no armário e tentar trazer uma mensagem mais proativa. A gente não gosta de pesar o rolê, sabe? A gente quer propor, mas sem pesar o clima.

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