Texto por: Clarice Cobra
A família Mad Sound fez a seleção dos 5 melhores álbuns de 2019. Na última semana tivemos Marcela Lorenzetti escolhendo seus cinco discos preferidos do ano.
Hoje, temos Clarice Cobra contando quais são os seus e porquê. Compartilhe e conte pra gente qual o seu top 5 do ano!
#5: Raça – Saúde
Confesso que a disputa para essa posição foi muito acirrada entre O Cão de Toda Noite dos cearenses maquinas, um ótimo disco de post-rock, e o Saúde, do Raça. O último levou por pura identificação pessoal. No final, amo a sensação de pensar “Nossa, eu!” quando escuto uma música, e foi o que aconteceu ao longo do Saúde.
Sincero, cru e vulnerável. Ouvir esse disco torna a transição da adolescência para a vida adulta menos dolorida. Mais humana. Relações são difíceis, amar pode doer e a distância é sentida. Falar sobre sentimentos tão abertamente não é para qualquer um, mas os meninos do Raça o fazem com maestria. Nem tudo o que sentimos é bonito ou necessariamente correto, mas são sentimentos. Somos humanos e longe da perfeição. É reconfortante ouvir que você não é o único a sentir algo indesejado.
Apegada que sou ao post hardcore que cresceu nos anos 90/00, amei ouvir esse disco.
#4: clipping. – There Existed an Addiction to Blood
Experimental, abstrato e coeso. Político. There Existed an Addiction to Blood é tudo o que pode se esperar de um álbum do clipping., mas como não o vimos fazer ainda. O trio explora o horrorcore, subgênero do hip hop popularizado nos anos 90 baseado em letras de horror e que explora o imaginário do ouvinte.
Talvez o trabalho mais político do grupo até hoje. Diggs, voz do clipping., aponta sem discrição a opressão que os americanos negros encaram, e nos faz sair da bolha. São tempos sombrios e muitos de nós não sentimos nem metade desse horror na pele. O horrorcore é muito bem vindo nesse disco – sangue, medo e brutalidade são realidades de muitos, a conversa é necessária.
#3: Kanye West – Jesus Is King
Uma conversa inspiradora com Deus. Autocrítica e fé. Pensamentos interrompidos e samples selecionados sob um microscópio. Um disco gospel de Kanye West. Para muitos uma surpresa, mas a fé do rapper norte-americano nunca foi segredo. Desde sua estreia com College Dropout (2004), Kanye aborda sua relação com Deus e religião.
O que mais me prendeu ao Jesus Is King é o mesmo que afastou muitos ouvintes – não é necessariamente um trabalho completo, mas um conjunto de ideias. Existe um formato obrigatório para uma produção artística musical? Algumas faixas soam interrompidas, não finalizadas, e isso me pareceu intencional, além de sincero. Apesar de gospel, é também pessoal.
#2: Fontaines D.C. – Dogrel
A estreia do irlandeses Fontaines D.C. para o mundo foi arrebatadora, e não é para menos, tempos críticos pedem bandas corajosas. Saudosistas podem argumentar que o punk está morto, me faço oposição. O punk e suas variações respiram ar puro e forças de bandas como Fontaines D.C., IDLES e Shame são inegáveis.
Em uma relação de amor e ódio com sua cidade natal, Dogrel nos convida a conhecer a hipócrita e cinzenta Dublin em “Big”, a pensar o formato de uma revolução sem esquecer o fator humano em “Too Real” e a celebrar os pequenos e íntimos momentos com a balada final “Dublin City Sky”. O post-punk vive e lateja na Irlanda.
#1: Big Thief – U.F.O.F./Two Hands
Me dei o direito de reunir dois álbuns em uma mesma posição, ambos da banda norte-americana Big Thief. U.F.O.F., lançado no primeiro semestre de 2019, é uma conversa sincera e intimista entre a vocalista Adrianne Lenker e o ouvinte. Sua atmosfera assemelha-se à obras como Either/Or, de Elliott Smith e Pink Moon, de Nick Drake, explorando novos caminhos instrumentais para musicar os poemas da inquieta e prolífica Lenker.
O destaque, para mim, fica com Two Hands, lançado em outubro. Seca a garganta e oferece um copo de água. O primeiro single do álbum, “Not”, me arrepia até o último fio de cabelo a cada ouvida. Diferente das outras canções já produzidas pelo quarteto, em que a beleza está em destrinchar o detalhe ao máximo e permitir o ouvinte fazer parte do cenário, “Not” traz o exercício de entender tudo o que não é, e buscar o que pode ser. O abstrato toma forma e o corpo aquece.