Os anos 2000 voltaram com tudo. Seja com o retorno de Avril Lavigne ou a popularidade recém-adquirida por Travis Barker, é fato que o mainstream abraçou novamente o pop punk e colocou nomes como WILLOW, Machine Gun Kelly e MOD SUN no radar depois de anos de tentativa. Em meio ao auge da nostalgia, ressurge um dos maiores nomes da cena nacional: a Fresno.

Aqueles que esperavam que a banda fosse surfar na onda saudosista do rock emo se enganaram. Apesar de ser um dos maiores nomes dos anos 2000, a Fresno situou seu novo som diretamente em 2021 com o lançamento de 20 faixas inéditas para o projeto INVentário. Apresentando uma face mais diversificada e experimental, a banda viajou por inúmeros gêneros e convidou uma série de nomes que quebram a barreira de sua zona de conforto, como Terno Rei, Jup do Bairro, Lio (Tuyo), Twin Pumpkin, entre muitos outros.

Demonstrando um entendimento profundo das tendências atuais que circulam nos mais diversos gêneros musicais, eles chegam com o excelente novo disco Vou Ter Que Me Virar. Indo na contramão do óbvio, o nono álbum de estúdio da Fresno é uma verdadeira explosão. Assim como já mostrado no INVentário, o projeto traz influências do hyperpop e faz uso abundante de alto falantes estourados, elementos eletrônicos, sintetizadores, riffs pesados de guitarra e um punhado de screamos de Lucas Silveira, mostrando que a Fresno não só sabe se reinventar, como também conhece exatamente o seu público e os caminhos a serem percorridos para entrar novamente no radar da indústria.

Como bem pontua Lucas Silveira na música de abertura e faixa-título: “vão ter que me engolir como sempre”. Em pleno 2021, depois de mais de duas décadas de estrada, é impossível ignorar a Fresno. Depois de todo o ódio enfrentado pela banda em seu primeiro auge nos anos 2000, Vou Ter Que Me Virar e INVentário são projetos pensados para agradar gregos e troianos. Em seu novo disco, a banda exerce sua autoridade e trilha novos caminhos sem medo, recebendo Lulu Santos em um pop chiclete e festivo na colorida “Já Faz Tanto Tempo” e arriscando até mesmo um samba emo na apaixonante “6h34 (NEM LIGA GURIA)”.

Vou Ter Que Me Virar traz uma seleção de inéditas que reforça a identidade da Fresno ao mesmo tempo em que os consagra como uma banda completamente liberta do nicho do emo – as composições, hoje mais maduras, ainda são sentimentais e profundamente tocantes, mas a sonoridade leva a banda para outros espaços. A faixa-título abre o álbum com uma sensação de iminência de catástrofe, ao mesmo tempo em que apresenta um refrão dançante com batidas eletrônicas, desaguando em seguida nas guitarras potentes e nos gritos de protesto e revolta da impactante “FUDEU!!!”.

Na soma dos fatores, Vou Ter Que Me Virar é um disco forte sobre resiliência no fim dos tempos e o confronto não só dos próprios demônios, mas também daqueles que se encontram da porta pra fora. O Lado A é mais poderoso e fluido, transitando entre a balada triste de “Casa Assombrada”, uma veia de metalcore na excelente “ELES ODEIAM GENTE COMO NÓS” e um electro rock sensual na sedutora “Agora Deixa”, ambas lançadas anteriormente no INVentário. O Lado B se mostra mais introspectivo e reflexivo, retratando o desgaste do cotidiano em “Essa Coisa (Acorda – Trabalha – Repete – Mantém)” e apresentando um dos melhores vocais de Lucas Silveira na arrepiante “Caminho Não Tem Fim”, que é uma de suas composições mais poderosas.

“Grave Acidente” encerra o disco retomando a mesma sonoridade e temática abordadas na primeira faixa, mas dessa vez trazendo a certeza da colisão no verso “eu sou um grave acidente/ eu vou acontecer”. E depois de todo o caminho traçado até aqui, a Fresno acontece. Com versatilidade e inteligência, a banda ocupa espaços até então inimagináveis para si e se faz destaque nas mais diversas paradas, seja do pop, rock, MPB ou eletrônica. Em meio à tendência crescente do pop punk saudosista, a Fresno dá as costas ao passado e abraça o presente com naturalidade e maestria, mostrando que sabe, de fato, se virar. Como sempre.

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