O trio das irmãs HAIM tem como sinônimo, desde o lançamento de seu primeiro disco Days Are Gone em 2013, adjetivos como estilosas, descoladas, cool. Mas, por trás dos óculos escuros, batidas indie contagiantes e clipes com desfiles pelas ruas de Los Angeles, muitos obstáculos e situações delicadas acontecem.

Em Women In Music Pt. III, o primeiro disco de Danielle, Este e Alana Haim, desde Something To Tell You, de 2017, as artistas depositam em seu novo projeto todos os sentimentos, desafios, e altos e baixos (muito baixos), que enfrentaram nos últimos anos, como a morte de uma das melhores amigas de Alana, a descoberta de diabetes tipo 1 de Este, e a severa depressão de Danielle, causada pelo fim da turnê do último disco, e pela descoberta do câncer de seu companheiro e produtor, Ariel Rechtshaid.

Colocar isso tudo em palavras deve ter sido um desafio e tanto, mesmo assim, o trio, conseguiu produzir sonoramente o disco de maior ecleticidade até agora, mantendo seu estilo sonoro clássico que nos faria falar “nossa, isso é muito HAIM” (como por exemplo na faixa “Don’t Wanna”), mas experimentando mais do que nunca e abrangendo outras influências como Joni Mitchell e Lou Reed.

Se tem uma opinião sobre a banda que é quase unânime, é sobre sua sonoridade ser extremamente californiana. O trio, natural de Los Angeles, inclusive começa o disco, com a faixa que leva o nome da famosa cidade, com dúvidas sobre continuar defendendo seu lar, mas finaliza o projeto, com “Summer Girl”, tendo certeza de estarem no lugar certo, o que já fica evidente conforme o disco progride e o “som californiano” só se concreta a cada faixa.

O ouvinte é ganho de vez já na segunda faixa do projeto, “The Steps”, com sua natureza folk e letra poderosa, fala sobre a tentativa da mídia colocar o trio dentro de uma caixa, questionando suas decisões como artistas.

A letra também pode se encaixar na realidade de um relacionamento em que uma das pessoas não aprecia e se sente ameaçado pelo sucesso da companheira. O som e composição imponentes fazem a faixa ser a mais forte do disco.

O poder da auto-valorização dá lugar ao poder da vulnerabilidade na faixa seguinte, “I Know Alone”. Com a sonoridade mais calma, indie e acolhedora, Danielle canta sobre seus episódios intensos e solitários enquanto enfrentava a depressão.

Durante a semana, a vocalista passa pelas mesmas ocasiões, trocando o dia pela noite, vendo a vida de um jeito “cinza”, ligando para seus amigos sem resposta. Na sexta, ela sente que está desperdiçando o tempo de todos, e já no domingo, todos esperam que ela esteja pronta para brilhar em uma nova semana. Danielle deixa claro que não irá ser o caso, já que a depressão é um ciclo que parece interminável.

A experiência da vocalista aparece em diversas faixas no decorrer do projeto, como em “Up From A Dream”, canção sobre não querer acordar e encarar a dura realidade, que começa com um bocejo com autotune de Danielle. A faixa possui outros elementos que reforçam a experiência do ouvinte de sentir o que está sendo contado na música, como gaivotas e um som de despertador no final.

Em “I’ve Been Down”, o sentimento de ter tudo para nos fazer feliz, mas ainda estar triste consome Danielle em uma canção feita a medida para se cantar junto em uma estrada aparentemente infinita.

Em certo momento da canção, a vocalista narra esse sentimento em um dos melhores momentos do disco: “I’m waking up at night, tick-tock, killing time / A little moonlight coming through the blinds / The love of my life sleeping by my side / But I’m still down”, comentários de fãs sobre a sensação ser semelhante ao sentido durante a quarentena não faltaram.

O tema romântico também aparece no projeto em faixas como a triste e ótima “FUBT” (“Fucked Up But True”), que reuniu experiências de relacionamentos abusivos enfrentados pelas irmãs no passado.

Em meio a cenários tão densos, faixas como “3am” e “Don’t Wanna” retratam situações divertidas relacionadas à decisões conscientemente erradas feitas enquanto estamos apaixonados. Enquanto a “Man From The Magazine” fala sobre o assédio de jornalistas às artistas (perguntando, por exemplo, se a baixista Este, que costuma se expressar facialmente durante as apresentações, reproduz as mesmas caretas na cama). Músicas como essas criam momentos de descontração que se encaixam bem durante o disco.

As irmãs Haim conseguiram, através de se permitirem a serem vulneráveis e aventureiras com o que compartilhar com o mundo e como fazer isso sonoramente, o melhor disco de sua carreira até agora, e a prova mais concreta (como se elas precisassem provar algo), de que esse é só mais um capítulo de uma longa e vital carreira para o mundo da música.

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