A “arte de recomeçar” não é novidade para Demi Lovato. Entre altos e baixos na vida pessoal e na carreira, a artista já mostrou ao público incontáveis versões de si mesma, cada uma aparentando ser mais forte e preparada que a outra. Em seu novo álbum Dancing With The Devil… The Art of Starting Over, lançado na última sexta-feira, 02, ela prova que ainda tem algo inédito e surpreendente a oferecer.

Marcada como a voz de uma geração desde a adolescência na Disney, Demi Lovato percorreu uma jornada tortuosa até o lugar promissor onde se encontra agora. Com apenas 18 anos de idade, sua batalha pessoal com abuso de substâncias, transtornos alimentares e automutilação já tinha sido jogada sob os holofotes e transformado a jovem em um exemplo de força e superação. Depois de seis anos lutando para se manter sóbria e ser um modelo de perfeição para as gerações mais novas, a cantora sofreu uma recaída que ocasionou uma overdose quase fatal em 2018.

Ser capaz de se aventurar em Dancing With The Devil… The Art of Starting Over é um privilégio. Esse é o único e verdadeiro álbum de superação já feito por Demi Lovato, assumindo o papel que deveria ter sido ocupado pelo genérico Unbroken (2011), que foi lançado após seu período de reabilitação e buscou o sucesso comercial explorando a narrativa de uma Demi renascida das cinzas. Em seu sétimo álbum de estúdio, Lovato abandonou sua antiga equipe e assinou com o empresário Scooter Braun, finalmente assumindo as rédeas de sua carreira e participando mais ativamente no processo de composição e produção de suas próprias músicas.

O resultado é o melhor álbum de sua carreira, completamente honesto, vulnerável e também divertido. Em Dancing With The Devil… The Art of Starting Over, Demi demonstra a liberdade e a autoconfiança que tanto almejou em seus trabalhos anteriores, falando abertamente sobre temas que antes tinham apenas tocado a superfície, como a descoberta de sua sexualidade e seus transtornos alimentares (nunca antes mencionados em suas músicas). 

Deixando para trás a necessidade de criar hinos de superação e se mostrar inabalável, a cantora escancarou seus sentimentos de frustração, solidão e sofrimento na potente “Anyone”, e não tentou embelezar sua difícil luta contra o vício em álcool e drogas ao reconstituir os acontecimentos de 2018 em “Dancing With The Devil”. Demi também incluiu no repertório uma poderosa versão do clássico “Mad World”, de Michael Andrews, entregando uma rendição emocionante, introspectiva e profundamente tocante da letra triste e contemplativa.

O álbum, contudo, não se apoia em suas músicas mais sombrias e nem se sustenta no episódio da overdose como forma de narração, com a própria Demi admitindo que está “cansada de ser lembrada pela [sua] doença”. Passando por esse tema logo no começo, o disco apresenta uma quebra depois da terceira faixa e abre espaço para diversão e positividade em canções que exploram o pop com elementos do funk, R&B e hip-hop alternativo, como é o caso de “The Art of Starting Over”, “My Girlfriends Are My Boyfriend” e a bem-sucedida colaboração com Ariana Grande em “Met Him Last Night”. Demi também assinou muitas composições ao lado de Julia Michaels, o que rendeu músicas com um teor maior de vulnerabilidade emocional, como a agridoce “The Way You Don’t Look At Me” e a descontraída e bem-humorada “Melon Cake”.

É muito gratificante testemunhar uma artista com tanto talento ser finalmente capaz de explorar seu potencial de forma sincera. Até mesmo os vocais de Demi foram melhor trabalhados em seu novo projeto, testando novas nuances e deixando um pouco de lado a necessidade de exibir seu alcance impressionante. Apresentando sua melhor versão enquanto cantora, compositora e artista, é evidente que, pela primeira vez na vida, Demi Lovato se sente confortável o suficiente na própria pele para admitir suas falhas e imperfeições com graciosidade ao invés de calçar os sapatos da perfeição que dificultaram sua caminhada durante tantos anos.