No romance O Estrangeiro, Albert Camus destrincha as angústias humanas na busca de um objetivo maior. Muitas vezes chamada de existencialista, por mais que o próprio Camus rejeite essa classificação, a filosofia por trás do livro defende que o mundo não é provido de sentido, que cabe ao indivíduo criar o próprio sentido através de suas experiências sensoriais.

Não é por acaso que o primeiro álbum do paulistano Vítor Guima herde o nome do romance. “Camus aparece no título e no conceito baseado na filosofia existencialista que permeia todo o disco”, confirma o cantor. Em O Estrangeiro, Guima explora essa busca humana pelo sentido da existência e parece se conformar com a eterna procura.

É como se o eu lírico do disco passasse por uma jornada de descobrimento. Na faixa de abertura “Do Lado de Fora”, por exemplo, Guima diz que olha para fora da janela mas não consegue se enxergar lá. É o não-pertencimento em uma realidade sem sentido. Com o passar da obra, o personagem passa a se movimentar e se contenta em não necessariamente chegar em algum lugar.

O álbum ainda traz pitadas de Charles Baudelaire e Fernando Pessoa, explicitamente presente em “Balada Para Álvaro de Campos”. É que, além de músico, Guima é cineasta e escritor. Todas essas referências vão aparecendo no emaranhado de estilos e influências que é O Estrangeiro. “Eu tento encarar a arte como algo unificado”, diz. Na capa do disco, está escrito “um álbum de Vítor Guima”, como um aceno a um elemento cinematográfico. “Coração na Cabine”, quarta faixa, soa como um road movie, clássico subgênero do cinema americano, abrasileirado.

Não poderia ser diferente, portanto, os compositores citados por Guima como inspirações. Bob Dylan, Belchior, Joni Mitchell, Patti Smith e Lô Borges. Em determinada música surgem acordes de samba, em outras de um indie-rock, em outras, ainda, de folk. Tudo isso sem parecer desconexo ou amontoado. Muito pelo contrário, uma das grandes qualidades do álbum é justamente sua solidez.

O Estrangeiro é para uma audição existencialista, solitária e reflexiva. Aqui, Vítor Guima se mostra um nome a ser acompanhado na nova MPB, com um trabalho consistente e bem produzido. Acima de tudo, uma obra fresca surgida de uma bem escolhida prateleira de referências artísticas.

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