Vítor Guima é escritor, compositor e cineasta, e já mostrou talento como cantor e artista solo no disco O Estrangeiro, lançado em julho de 2019. Agora, o brasileiro navega pelo mundo literário ao anunciar o primeiro livro de poemas autorais.

A Morte da Graça no Baile dos Erros chegará às livrarias ainda no primeiro semestre pela Editora Urutau, e, para acompanhar o anúncio, Guima divulgou uma prévia do livro, liberando três dos poemas presentes na obra.

Sombras e Fogo, Yumi e Os Espelhos foram divulgados pela revista Mallarmargens, e, aqui reproduzimos os poemas – veja logo abaixo.

Ao falar sobre os poemas que divulgou, Guima explica, em uma declaração à imprensa: “Sombras e Fogo é um tributo a um dos meus cineastas prediletos [Sergei Parajanov], na verdade um dos maiores cineastas da história, e também um lembrete que a censura está e sempre esteve pairando sobre nós – mas que ela nunca vencerá!”

“Já Yumi trata da ressignificação de experiências e da construção da memória, que é o tema principal de A Morte da Graça no Baile dos Erros, enquanto Os Espelhos fala da aura dos fantasmas nos reflexos que encontramos pelo caminho.”

Segundo o artista, A Morte da Graça no Baile dos Erros é uma coleção de poemas que trata de “pequenas e grandes mortes e da construção da memória”. Mais detalhes sobre o lançamento serão divulgados em breve.

Sombras e fogo
a Sergei Parajanov

no dia em que foram
esquecidos
os signos das frutas e
suntuosas vestes
santificadas em película
nas mais vívidas cores

as sombras de fogo e os
cavalos dos meus antepassados
de ensandecidas maneiras
relembraram a história
das censuras

daqueles registros das jantas com suas tantas galinhase infinitos véus

o templo das imagens, das luzes e da realidade
encarcerado
as esculturas e bonecas destruídas
em tão semelhantes uniformes
do que teriam sido tingidas as
fitas
fora de um jogo de xadrez?

qual o limite bestial
das entidades que pretendem aniquilar
o encanto?

a imagem
cicatrizada no fundo dos globos
não permite o
mais abominável dos vetos
nem suas incontáveis lacunas.

Yumi

depois do gole de saquê do almoço
observo a palha
tentando desvelar a
coloração das
ventanias

nesses dias embalados
do tic tac dos hashis,
lembro de ter reparado
na metade dianteira dos tigres,
no batismo dos bonsais que acabei fazendo
em algum lugar de Shibuya

esmagado por seus tamancos e máscaras
consegui encontrar as ritmadas mensagens decodificadas
em
5
7
5

que tipo de tatame é necessário para que eu descanse?
qual tecido, sombrinha ou véu é preciso para que me possa tocar?

ao percorrer
uma a uma
as armadilhas do pó de seus haicais,
inverto meus eixos ao colher flores de cerejeira
e transformo minhas fogueiras
em pequeninas brasas
para poder pensar o céu

Os Espelhos

ao apagar as luzes
quantos reflexos estão a uma fagulha
da extinção?

é tão difícil parar de reparar
nas sombras dos quartos
formadas pela luz
dos corredores

parar de esperar uma
ventania que leve
o barulho daquela sirene que nunca
parou de tocar

qual poder é maior do que a representação?

partes de nós
precisam morrer para que
o resto viva
(mas talvez não
continuemos
vivendo muito
bem)
nas estimativas

diagramas de olhares
algoritmos de perfumes
hipóteses nas bocas

uma amálgama de prata e de poemas

dois labirintos
que levam à glória

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