Ser uma mulher preta com uma carreira brilhante na música, expandindo cada vez mais suas habilidades e desafios: essa é a realidade de Mahmundi, que no projeto Sorriso Rei, realizado em parceria com a Universal Music, tomou o cargo de Diretora Criativa do projeto, que ao lado de nomes como Léo Santana, Ruby, Priscila Tossan, Xandi de Pilares, Mumuzinho, Malía e Mc Zaac homenageiam e celebram a cultura preta bem a tempo do Dia da Consciência Negra, comemorado hoje, 20.
O projeto, que consiste em uma revisitação dos clássicos “Tempo Rei”, de Gilberto Gil, e “Sorriso Aberto”, por Jovelina Pérola Negra, simbolizando, nas palavras da diretora, dois Brasis diferentes, foi realizado além de por novas vozes pretas, por uma equipe que priorizou profissionais pretos para conceber as gravações e também o documentário da iniciativa, que tem na direção Yasmin Thayná. “Tava um clima muito de pessoas pretas se divertindo, se encontrando, algo cada vez mais raro no mundo do entretenimento onde a gente tem uma hierarquia invísivel que te impossibilita de muita coisa (…) Foi um desabrochar de ideias”, compartilha Mahmundi na coletiva de imprensa que o Mad Sound estava presente.
Sobre os desafios de assumir um cargo inédito em sua carreira, Mahmundi teve que entender seu novo lugar, e apagar códigos anteriormente presenciados por ela durante sua jornada musical, como ações machistas e de superioridade de profissionais por trás da mesa de som de um estúdio, “Minha maior preocupação era essa, que eu tava ali pra servir como um canal para me comunicar com essas vozes e que eu não podia perder as vozes…”, ela conta. “Direção criativa é quando você conserva o artista e entende como se faz o produto ali, como é o acabamento que ele quer (…) É entender o caminho do artista para que ele se comunique com aquilo.”
Para Sorriso Aberto, entender esse caminho se tratava de incorporar os artistas presentes no projeto, seus gêneros musicais, e mais do que isso, sua história e contexto de vida como pessoas e artistas pretos no Brasil, existência esta certamente nada fácil, e para ser comemorada em Sorriso Rei, se trata de um contínuo processo de educação. “Eu não caio nesse papo de Black Lives Matter não, cara, porque pra mim isso é na prática”, afirma Mahmundi sobre a natureza política do projeto. “Política pra mim é o corpo presente habitando nos lugares.”
“Tinha em mim uma necessidade para ser o que nem eu gostaria ser”, ela revela, ao recordar sua carreira frequentemente cercada de homens brancos, heteronormativos e que prezavam por um pensamento capitalista ao criar arte, descoberta esta realizada quando a artista retornou às suas raízes no Rio de Janeiro, e que também a levaram a ensinamentos que estavam presentes na mesa de reuniões de Sorriso Aberto com a Universal Music, “Quem são essas artistas? Como essas artistas existem? Esse padrão branco heteronormativo de consumo pro homem ainda, nem todas nós somos isso”, ela recorda de questionar.
“Eu estou no auge da minha desconstruição, mesmo. Desejando muito mais do que sei lá sair na capa de uma revista hoje como Mahmundi, é saber se a tia que vende hambúrguer vai saber meu nome”, afirma.
Já para Ruby, também presentes na coletiva, que até pode ser uma jovem artista quando se trata da carreira profissional, a busca pela celebração de sua cultura e de seu povo está sendo fruto de uma verdadeira pesquisa em busca de si própria, “Eu acredito que pra mim esse processo veio através da minha busca pela minha anscestralidade, quando eu fui buscar a minha história não pelo que foi erroneamente me ensinado na escola pela cultura no nosso país, que é uma cultura racista (…) E a partir disso pesquisando a origem de tudo, você descobre que todos os seres humanos do mundo tem uma ancestral em comum que é a mulher preta, que foi a primeira mulher encontrada no mundo, a primeira ossada…”
“Eu prefiro buscar olhar, e é assim até um pouco utópico porque sendo preto em uma sociedade racista você é lembrado o tempo inteiro que você é preto”, complementa, “Mas eu tento o tempo todo tentar utilizar a potencialidade que existe no nosso povo, e que existe em mim, e usar isso a favor, sempre. E se eu sou uma estátistica, eu quero ser uma estatística daqueles que fazem a diferença.”