O Teatro Paulo Autran, no SESC Pinheiros em São Paulo, tem capacidade para 1.010 pessoas. Mas no dia 1º de abril, quando as luzes do auditório se apagaram às 18h, a sensação era de que o número de presentes havia diminuído drasticamente. De mais de mil, sobraram apenas dois: no palco, Tim Bernardes, na plateia, uma multidão de experiências solitárias.

A unicidade dos relatos é resultado da crua honestidade da apresentação, que parece ter sido desenhada para construir proximidade entre o público e o músico, que comandou vocais e se alternou entre piano, baixo e guitarra durante cerca de 1h30. Despido da configuração de banda — que tem com O Terno desde 2009 —, Bernardes construiu uma parte do universo pessoal no show de lançamento do vinil de Recomeçar (pela Noize Record Club), disco de estreia solo que chegou nas plataformas digitais e no formato CD em 2017.

“Em Recomeçar falo sobre a solidão, mas de um jeito que não é positivo nem negativo. [Falo] sobre a eterna busca para completar o vazio enquanto estamos sozinhos”, explicou. “E é por isso que trouxe para o repertório músicas que acredito falarem sobre a mesma coisa”, disse, antes de tocar uma cover de “Que Nega É Essa”, de Jorge Ben Jor, a primeira de sete versões da noite. Ainda vieram “Esotérico” e “Luzia Luluza”, de Gilberto Gil, “Changes”, do Black Sabbath, “Paralelas”, de Belchior, “Soluços”, de Jards Macalé e “Gata Mágica”, composição de um amigo.

Reconstruindo o conceito de “show intimista”, Bernardes explorou referências pessoais, o trabalho com O Terno (em faixas aclamadas como “Quando Eu Me Aposentar”, “Melhor do Que Parece” e “A História Mais Velha do Mundo”) e a beleza dura do trabalho solo em uma performance que hipnotizou o público paulistano. Com receio de invadir o espaço do artista, a plateia acompanhou as faixas aos sussurros, só aumentando o tom de voz quando a demanada — “quero ver todos cantando alto” — apareceu, antes do refrão de “Melhor do Que Parece”.

O show de Recomeçar é um retrato do potencial criativo da solidão humana e um exemplo do potencial artístico dos novos compositores da Música Popular Brasileira. Nele, Bernardes expande o alcance do trabalho com a experiência solo, desfilando bagagem musical, não negando a importância d’O Terno e mostrando uma conexão invejável com o público.

Abaixo, veja a setlist do show.

“Abertura (Recomeçar)”
“Talvez”
“Tanto Faz”
“Pouco a Pouco”
“Quis Mudar”
“Que Nega É Essa” / “Esotérico”
“Ela”
“Quando Eu Me Aposentar”
“Changes” / “Paralelas”
“Era O Fim”
“Ela Não Vai Mais Voltar”
“Soluços”
“Não”
“Incalculável”
“Calma”
“Luzia Luluza”
“As Histórias do Cinema”
“Melhor do Que Parece”
“A História Mais Velha do Mundo”
“Recomeçar”
Bis:
“Volta”
“Gata Mágica”
“Pela Metade”
“Eu Vou”

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