Quem vê luta talvez não veja afeto. Mas em Correnteza, novo disco do artista e pedagogo Thiago Elniño, lançado em 23 de março, ambas as palavras seguem juntas, praticamente intrínsecas.
Sob a trilha sonora que coloca em voga sons vindas de seus ancestrais e com uma pluralidade de discussões, preocupações e desejos vindas do povo preto que luta todo dia pela sua sobrevivência e lugar certo na sociedade, o disco é intenso, mas dançante, íntimo e introspectivo, mas alto e coletivo, tão direto e reto que é quase cortante, mas com muita esperança para seguir.
Esperança essa que também foi traduzida para os bastidores da música com o projeto Disco Escola, protagonizado por Thiago e os colaboradores de Correnteza, que compartilham através da plataforma, democraticamente, conhecimentos sobre todas as áreas da gestão de carreira de um músico independente.
O Mad Sound conversou com o artista sobre o sucessor de Pedras, Flechas, Lanças, Espadas e Espelhos, suas referências, colaborações e aspirações para o projeto e para a missão de Elniño no meio cultural e educativo.
Mad Sound: Thiago, Esse disco é realmente incrível do começo ao fim, sem intervalos. Cronologicamente, como ele nasceu?
Thiago Elniño: Esse disco nasceu da necessidade de produzir para sobreviver, enquanto artista em um momento onde existia poucas possibilidades de geração de renda surgiu a oportunidade través de de um edital, tivemos que produzi-lo em 2 meses e aí a necessidade de sermos fortes para atravessar esse momento do mundo virou o conceito do disco, como no ditado africano que dizia que a água sempre encontra seu caminho, a gente ali ia ter que ser Correnteza pela nossa própria sobrevivência!
MS: Após receber Luedji Luna, Rincon Sapiência, Tássia Reis entre outros em seu disco de 2019, em Correnteza você recebe Zé Manoel e Mingo Silva em dobro, além de Sant. Nas faixas com colaborações, como as canções foram concebidas?
TE: Os colaboradores são sempre pessoas que tenho alguma proximidade, Zé Manoel e Mingo vinham sendo os dois artistas que mais escutava antes da produção do disco, eles vinham me ajudando a suportar a dor desse momento do mundo, e esse suporte se estende a música que fazemos juntos. Sant é um dos meus melhores amigos e já vinha demorando para termos mais músicas juntos!
MS: O disco também possui colaborações da historiadora Luciane Dom, e da escritora e cantora Daiana Damião. Como surgiram essas parcerias e por que a presença das duas foi vital para o disco?
TE: Antes de mim, as músicas sempre pedem as participações e eu confirmo a possibilidade, a música com a Luciane pediu ela, e assim como a Daiana Damião é uma amiga querida, fazia muito sentido estarem no disco e sem dúvida a presença delas iluminou demais a obra.
MS: Esse disco possui capítulos, começo, meio e fim com temáticas diversas, claras e impactantes para o ouvinte. Como foi pensar no conceito do projeto em termos de temáticas e sons que seriam abordados, e na experiência do ouvinte pensando no fluxo do disco?
TE: O disco é dividido em 3 momentos, começa com um Afrobeat tradicional de Fela Kuti e termina com um Afrobeat moderno de WizKid e BurnaBoy por exemplo! A ideia era fazer esse passeio por vários “pontos de força” sonoros do povo preto pelo mundo.
MS: Thiago, que incrível é o projeto Disco Escola, que surgiu como um braço de Correnteza estendo a mão para outros músicos e profissionais da música. Como surgiu esse desejo da iniciativa e como você está se sentindo com ele finalmente no ar?
TE: Eu me defino como um educador que tem a música como recurso pedagógico, minha ideia é sempre a de sugerir coisas que antes me atravessaram e fizeram bem, no meio do deserto achar grandes lagos de água potável e não compartilhar com teu povo não é uma possibilidade que o povo preto deva cogitar! Sendo toda possibilidade de boa experiência individual eu busco também a oportunidade que ela se torna algo útil a nível coletivo, e assim foi com o disco escola, uma ação simples de compartilhar com o máximo de músicos possíveis a oportunidade e conhecimentos que diariamente eu estava acessando de profissionais incríveis com muito a dizer! E tá sendo lindo ver o projeto ganhar a rua e se movimentar bem!
MS: Em meio a tantas novidades e ao mesmo passo, incertezas quando pensamos no panorama geral do Brasil, o que podemos esperar para os próximos meses da sua carreira?
TE: Terminei o disco completamente destruído psicologicamente pela pressão da entrega e necessidade de boa performance do projeto, ver um disco sair e ser tão bem recebido e não poder estar na rua recebendo esse carinho, trocar e tocar com as pessoas me fez muito mal, então se a ideia é ser Correnteza, estou sendo para ficar bem, só têm que esse processo da minha busca por ficar bem, eu também vou transformar em conteúdo que possa contribuir com a comunidade em geral! Então teremos sem dúvida bastante conteúdo ligado a sermos Correnteza, a nos fortalecer e criar sanidade para que caso exista luz no fim do túnel, estejamos lá!
Ouça Correnteza, de Thiago Elniño logo abaixo: