O Twenty One Pilots é a banda perfeita para a geração millennial. Um recorte geracional que lida com doenças psicológicas, com a falta de perspectiva para o futuro, com a dificuldade em amadurecer. Uma juventude dispersa, que não se encaixa nem na era pré-digital, nem na imersão total das redes sociais e smartphones, mas sofre com a falta de foco que resulta de ambas.
O duo, formado por Tyler Joseph e Josh Dun, possui cinco discos na discografia. Todos eles são musicalmente e tematicamente condizentes com a descrição da geração Y. O Twenty One Pilots tem uma mistura de gêneros que parece nunca acabar. O rock alternativo se funde à música eletrônica e ao rap emo, o ska dando as caras de vez em quando e o piano e o ukelele sempre presentes. A dupla troca de estilos e de tempo às vezes mais de uma vez na mesma música. Parece inconstante, mas funciona.
Funciona, muito por causa da temática que permeia toda a discografia: a depressão. Palavra que recebe embaixo de seu guarda-chuva outros subtemas que lidam com os demônios interiores e o medo. Um dos trunfos do letrista Tyler Joseph é transformar o mundano e banal, que às vezes parece recortado numa vivência de classe média, em algo universal para quem sofre dos mesmos problemas.
“Eu tenho esses pensamentos tantas vezes/ que eu deveria preencher aquele vazio/ porque alguém roubou o rádio do meu carro/ e agora eu sento em silêncio/ Às vezes o silêncio é violento”. É o que diz a letra de “Car Radio”, uma das músicas que fez com que o duo estourasse em 2013 com Vessel. Em 2015, o mundo descobriu “Ride” e “Stressed Out”, de Blurryface, que viraram hinos para o grupo de fãs chamado de “clique”.
O disco de 2015 já apresentava uma ideia conceitual do personagem Blurryface, um alterego de Tyler Joseph que representava o lado depressivo do cantor. No fim do disco, Blurryface e Tyler pareciam se separar. Foi só em 2018, com um disco que assumia a construção de conceitos e narrativa completamente, que o Twenty One Pilots criou a grande metáfora da carreira até aqui.
Blurryface aparece em Trench, o disco do ano passado, encarnado em Nico. Este é um dos nove bispos que controlam a cidade de Dema, da qual o eu-lírico Clancy precisa escapar, uma vez que os bispos se alimentam da felicidade dos habitantes. Dema é uma cidade cercada por altos muros, o que torna a missão de Clancy mais difícil. A personagem se junta ao grupo de rebeldes chamados de Banditos, que usam roupas amarelas e fogo para enganar e escapar de Nico e os nove bispos.
Toda essa história, que se apresenta aos poucos durante as músicas de Trench, é uma alegoria para as doenças psicológicas. Dema é o estado depressivo do qual Tyler e muitos outros ao redor do mundo tentam diariamente escapar. “East is up” (“O Leste é para cima”) é o lema dos Banditos, que aparece na faixa “Nico And The Niners”. O Leste é de onde vem o sol, a claridade. No caso de Dema, é para cima, fugindo dos altos muros da cidade.
Esta faixa, inclusive, apresenta uma das frases mais fortes e realistas da discografia do Twenty One Pilots. “Vamos ganhar/ mas nem todo mundo irá sair”. “Nico And The Niners” é uma música de resistência contra a onda de suicídios. “Guarde suas lâminas/ ainda não é o momento”, é outra pedrada que a letra traz.
“Jumpsuit”, que concorreu ao Grammy de Melhor Música de Rock em 2019, é uma das formas de lidar com a doença. A Jumpsuit, o macacão usado pela dupla, é uma forma de conforto e de proteção. Os Banditos usam seus trajes, quase roupas para uma revolução, e tentam escapar de Dema.
Trench foi escrito depois da morte de artistas importantíssimos como Chester Bennington, do Linkin Park, e Chris Cornell, do Soundgarden. Uma das músicas, “Neon Gravestones”, fala justamente de como a mídia e a sociedade tratam da morte desses ídolos. Estaríamos romantizando o suicídio?
Por mais que não traga soluções, a vibe de empoderamento da discografia do Twenty One Pilots é importante para todas as gerações. É preciso falar do medo e das doenças psicológicas. É preciso combater o chamado mal do século.
Nos shows, os fãs se juntam, com roupas amarelas, os trajes descritos pela música “Jumpsuit”. Quando se está sozinho a luta pode ser mais difícil. Quando alguém entende o que você está passando, as coisas começam a se tornar menos impossíveis. Quando se tem um grupo, ou um “clique”, é mais fácil guardar as lâminas e seguir lutando.
O Twenty One Pilots se apresenta no Lollapalooza Brasil 2019. Compre os ingressos aqui.