No final de janeiro, Esteban Tavares lançou uma belíssima versão de “Vida Real”, do Engenheiros do Hawaii, como parte de um projeto acústico que envolve várias releituras de músicas espalhadas por sua discografia. Mais conhecido como Tavares, o músico adotou o nome Esteban para seu projeto solo pós-Fresno e segue com ele até hoje, 10 anos depois.

Quem acompanha a carreira de Tavares sabe da relação não só profissional, mas também de amizade e admiração com o cantor Humberto Gessinger, que em parte inspirou a gravação da nova versão de “Vida Real”. Para além da homenagem, a canção também dialoga muito com o mundo atual e com o próprio Tavares de maneira pessoal, e por isso foi incluída no projeto que em breve se tornará álbum.

A ideia de revisitar algumas de suas canções surgiu durante a pandemia como uma forma de presentear os fãs e reapresentar faixas que alguns talvez não conhecessem. Para a releitura de algumas canções, Tavares decidiu convidar alguns amigos e pessoas das quais gostava, o que enriqueceu ainda mais o projeto. Entre as faixas já lançadas, “Temporal” tem a participação de Roberta Campos e outras três parcerias ainda estão por vir: uma delas com Hélio Flanders, do Vanguart, “Milonguita”, com Matheus Porto e Moyses Kolesne, do Krisiun, e “Pianinho”, com o cantor mineiro Bemti.

“Eu nunca fui muito de feat,” conta Esteban Tavares em entrevista para o Mad Sound. “Acho que as coisas que eu escrevo cabem pra mim mesmo, pra eu cantar. Mas dessa vez eu falei: ‘Bom, como eu vou reler algumas músicas, botar elas no violão, e como são músicas que eu já lancei, já gravei, eu acho que é a hora de chamar o pessoal que eu gosto’.”

Dentre os lançamentos, um que foi recebido com muito entusiasmo pelos fãs foi o de “As Terças Podem Se Inverter”, com participação de Lucas Silveira. Essa foi a primeira gravação de estúdio da dupla desde a saída de Tavares da Fresno, há 10 anos, e serviu para dispersar os rumores de algum possível desconforto entre os dois artistas. A gravação foi feita de maneira remota, com cada um em seu próprio estúdio e trocando mensagens via WhatsApp, mas o resultado traz um sentimento nostálgico, ao mesmo tempo mesclado com a sensação de algo atual, diferente e mais maduro.

“A gente sempre teve uma boa dinâmica cantando junto e eu sei que a galera ia ficar feliz pra caramba, né?”, conta Esteban. “A gente sabe que nós dois tivemos alguma importância para os jovens da época. Várias duplas de bandas tiveram – seja porque se completavam cantando ou porque o objetivo da banda no momento era fazer daquele jeito.”

“Claro que é do caralho gravar com o Lucas porque a gente já gravou muita coisa junto. Não foi bem uma novidade porque a gente já gravou muita coisa junto há muito tempo, mas eu sei que a galera fica superfeliz porque também tira um pouco dessa coisa que, embora não exista entre a gente, existe entre o público. Aquilo de: ‘Nossa, o cara que era da banda. Será que eles se dão bem? Será que não? Por que saiu? Se saiu? Qual foi o problema?’. Então a gente vai lá e toca junto pra desmistificar esse tipo de coisa também, acho que é super válido,” conclui.

Ainda no clima de revisitar o passado, Esteban Tavares se encontra atualmente em turnê para celebrar os 10 anos de seu primeiro álbum solo, ¡Adios Esteban! (2012). Apesar do tempo que passou, Tavares conta que percebeu gostar muito do disco durante a turnê e considera este um projeto que “envelheceu bem”. 

“É meio estranho e arrogante falar que eu sou fã desse disco porque ele é meu disco, mas eu fico muito feliz pelo trabalho que eu fiz nele. E, claro, foi um disco que teve muito mais tempo e menos preocupação do que os outros,” explica. “Preocupação no sentido de que quando eu fiz [o álbum] eu estava na Fresno e não ia sair da Fresno. Tava ali fazendo meu projeto solo. Então quando eu quisesse lançar música, eu ia lá fazer minhas músicas e não tinha pretensão nisso. Não te gera estresse. Porque eu só precisava às vezes lançar uma música no MySpace, e se não quisesse lançar também nada ia mudar. Porque na verdade o carro-chefe da minha vida era a Fresno. Eu tinha feito um disco despreocupado. Não era minha obrigação fazer.”

Em contrapartida com essa leveza, Tavares explica que fazer música depois que um primeiro álbum é bem recebido se torna um grande desafio. De repente, o artista sai do campo das possibilidades para lidar com a pressão de passar a construir um repertório que se mantenha relevante para o público, interessante musicalmente e também fiel ao seu próprio trabalho.

“Qualquer banda que faz o primeiro disco tá despreocupada,” comenta. “Porque ela ainda não sabe o que vai ser, se vai ter sucesso, se não vai… É tudo uma incógnita. A partir do momento que tu tem uma carreira – se é que dá pra chamar assim – tu tem que lançar mais coisas, aí tu começa a ficar muito preocupado porque tu teve aprovação de uma coisa que tu não teve um compromisso tão grande em fazer. Tu não estava apavorado pensando ‘Se isso aqui não der certo, a minha vida não anda’.”

Com cinco álbuns de estúdio em sua discografia, Esteban Tavares admite que a pressão do trabalho seguinte nunca diminui. Pelo contrário, ela se torna cada vez maior e traz consigo uma dúvida muito pessoal do artista. “Será que um dia eu vou conseguir fazer outro disco inteiro que eu goste?”, questiona. Após o lançamento do álbum acústico, Tavares quer se dedicar ao seu sexto álbum de estúdio oficial, e esse novo projeto vem com um desafio diferente: é a primeira vez em sua carreira solo que Tavares deixará o disco na mão de um produtor que não seja ele mesmo.

“É uma vontade minha, né? Eu achei que depois de muitos trabalhos sozinho, me auto produzindo, tava na hora de eu começar a ouvir a opinião dos outros também,” explica. “Se produzir é muito bom, mas ao mesmo tempo é egoísta porque a única pessoa que diz se tá bom ou ruim antes de lançar é tu. Então também é muito fácil se boicotar e achar que uma coisa tu gosta todo mundo vai gostar. Acho que um produtor de fora tem a capacidade de abrir a tua cabeça para outras possibilidades – desde arranjo até mudar algumas coisas na música. Claro que se, no final das contas, as coisas não saírem do jeito que eu esperava, eu volto a fazer o próximo disco sozinho, sei lá. Mas eu acho que essa chance eu tinha que me dar.”

O esboço do novo álbum ainda está em fase inicial, então Tavares admite ainda não saber exatamente como irá soar o projeto, mas garante que será “a coisa mais diferente” que já fez, especialmente por estar trabalhando com a novidade de deixar o produtor e os músicos livres em sua participação no disco. Liricamente, ele ainda não sabe que caminho o projeto vai tomar, mas sonoramente, garante: será um álbum de rock.

“Musicalmente, ele é o disco mais… Não me arrisco a falar ‘rockeiro’ porque às vezes as pessoas acham que eu vou tocar guitarra com muita distorção e coisas assim – que é uma coisa que eu não faço há anos e não faço mais mesmo,” conta. “Mas ele tem muita coisa de bandas que eu tenho ouvido ultimamente, então eu sempre me deixo absorver as coisas que eu gosto. Muitas dessas coisas que eu tenho ouvido atualmente são versões modernas de coisas que quem fazia era Beatles, [Rolling] Stones, etc. Os outros discos também eram muito cheios de atmosfera e com muitos elementos sonoros, não tão diretos. Acredito que ele vai ser mais direto que os outros, musicalmente falando.”

É impossível falar de rock sem mencionar a falta de suporte e o baixo investimento que o gênero recebe no Brasil. Enquanto os anos 2000 representaram um período bastante frutífero para o gênero com o surgimento de bandas como Nx Zero, a própria Fresno, a chegada de Pitty, e até mesmo o “rock colorido” dos anos 2010, atualmente o rock perdeu espaço para gêneros como o sertanejo e o funk comercial, dificultando o surgimento de uma nova “cena” que receba destaque no mainstream e nas rádios, como já foi um dia.

“O rock agora tá na maior armadilha pop de todos os tempos, que foi esse comeback do emo, não foi nem do rock. Porque o rock também é mais extenso que só uma fase emo, pop punk,” reflete Tavares. “Não sei se isso não é aquela armadilha pop, do tipo: Ah, o Machine Gun Kelly veio pra trazer de volta um estilo porque ele era um rapper que passou a virar um roqueiro rebelde que fez despertar um espírito emo, pop punk, no mundo, aí hoje em São Paulo tem um monte de festa, em todos os lugares tem festa, um monte de banda voltando. É legal! Mas isso aí é aquele ‘remember’ que daqui a pouco também sai voando que nem uma folha seca e deu, já acabou.” 

“O Brasil enquanto ouvinte é muito americanizado,” continua. “E nos Estados Unidos faz muito tempo que o rock tá fora do que é ser bacana. Enquanto aqui na América Latina e na Europa o rock é fortíssimo ainda. Mas o Brasil, americanizado que é, também tirou um pouco o rock dessa frente. Eu acho legal esse ‘voltar’, tô trifeliz pela volta do Nx Zero, primeiro show que tiver em São Paulo eu vou, com certeza. Mas eu queria ver banda de uma galera de uns dezoito anos com espaço, saca? Que chegasse um bom empresário e tivesse interesse, que conseguisse uma boa gravadora que se interessasse em fazer isso andar, senão a gente vai ficar vivendo de ‘remember’, né? Não estou falando que não existe banda. Eu estou falando que não existe espaço pra ser dado pra essa galera.”

Mais informações sobre a agenda de shows de Esteban Tavares podem ser encontradas clicando aqui. Acompanhe os lançamentos do artista através das redes sociais: @estebantavares.