Texto por: Ana Clara Martins

Em sua primeira passagem pelo Brasil, logo após se apresentar no Primavera Sound, em São Paulo, Mitski atraiu uma legião de fãs para seu show no Rio de Janeiro. Com ingressos esgotados, uma verdadeira multidão aguardava para entrar no Sacadura 154, na última segunda-feira, 7. Mesmo debaixo da chuva, a expectativa e animação eram palpáveis.

A cantora, instrumentista e compositora nipo-americana levou ao público carioca a turnê do seu último álbum, Laurel Hell (2022). O novo disco marcou o retorno de sua carreira artística após o anúncio de um hiato, realizado em 2019 durante uma apresentação no Central Park, em Nova York. Durante a sua ausência, a artista foi lançada ao estrelato, com a hashtag “Mitski” atingindo mais de 1.5 bilhões de visualizações no TikTok

Foi imerso nesse cenário que o sexto álbum de Mitski nasceu, influenciado pelos sons eletrônicos dos anos 80, distanciando-se dos seus primeiros trabalhos, que eram mais crus e seguiam os passos de um rock de garagem, como Retired from Sad, New Career in Business (2013) e Bury Me at Makeout Creek (2014). Apesar de já ter explorado novas sonoridades em Be the Cowboy (2018), Laurel Hell revela outros caminhos seguidos pela artista, que traz uma turnê na qual, mesmo com a crescente fama, busca desviar o foco de si para a sua arte.

A abertura ficou por conta de ÀIYÉ, nome do projeto encabeçado pela paulistana Larissa Conforto, ex-baterista da banda Ventre, que encerrou as suas atividades em 2017. Em meio a um cenário repleto de flores, ÀIYÉ apresentou músicas do seu primeiro EP, Gratitrevas (2020), que perpassam por diversos gêneros, desde o pop até o reggaeton, mas sempre sustentadas pelo pilar da música eletrônica. “Pulmão“, “Semente“ e “Terreiro“ foram algumas das canções que integraram o seu setlist, além de uma releitura de “São Jorge“, do grupo Metá Metá. 

O momento que antecedeu o show de Mitski foi marcado por gritos intensos e grande ansiedade do público, de maioria jovem – muitos acompanhados pelos responsáveis – que respondia em peso a qualquer mínimo movimento dos roadies. Quando a banda entra no palco, a gritaria chega ao nível ensurdecedor, quase anulando o som dos sintetizadores crescentes que compõem a primeira faixa apresentada, “Love Me More”. 

Toda expectativa da plateia se concretizou na hora em que Mitski sobe no palco, usando um vestido lilás esvoaçante que respondia perfeitamente a cada movimento da artista. As suas coreografias baseadas na dança teatral japonesa chamada butô, complementam as letras sobre anseios, inquietudes e cansaço. 

Não só canções do disco Laurel Hell marcaram presença no show, como “Working for the Knife”, “The Only Heartbreaker” e “Stay Soft”, mas também clássicos dos seus primeiros trabalhos, como “First Love / Late Spring”, “Your Best American Girl” e “Goodbye, My Danish Sweetheart”. 

Mitski interagiu com a plateia poucas vezes, mas sempre com muito carinho. “Vocês sabem todas as palavras!”, disse depois de um dos diversos momentos em que o público cantou cada pedaço da letra. Entre “Eu amo muito vocês” e “Obrigada”, ela não disse muito, mas expressou sua felicidade em estar se apresentando em solo carioca. 

Acompanhada de Jeni Magaña no baixo, Patrick Hyland na guitarra, K. Marie Kim no teclado e Bruno Esrubilsky na bateria, a artista demonstrou entrosamento e conforto com os seus músicos de apoio, que não interagiram muito entre si. A exceção se deu quando Mitski disse “Eu não sei falar português, me desculpem” e entregou o microfone ao baterista, que falou “Fora Bolsonaro!”, fazendo com que a cantora mergulhasse em gargalhadas e falasse “O Bruno também é do Rio!”. 

O encerramento do show se deu com a balada “Two Slow Dancers”, seguida pelo bis, com a intensa “A Pearl”, sintetizando a força da primeira passagem de Mitski pelo Brasil. Não podemos prever quais serão os próximos passos da cantora, que já se mostrou desanimada com a carreira musical outrora, mas noites como essa mostram que há muito espaço no Brasil para Mitski e para sua música emocionalmente exigente e densa, principalmente entre os mais jovens.

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