Na última sexta, 26,  Baco Exu do Blues realizou seu primeiro show de 2024 no Espaço Unimed, na zona oeste de São Paulo. O artista revelação da música atual segue promovendo o último álbum, ‘QVVJFA’ (Quantas Vezes Você Já Foi Amado?), lançado em 2022. Nascido Diogo Álvaro Ferreira Moncorvo, em Salvador, não deixa dúvidas sobre de onde vem e a que veio, com músicas que mostram diversas influências regionais e musicais, tradições das religiões afro-brasileiras e um swing raro de se encontrar.

Baco é homem, jovem e negro, que em sua narrativa enaltece a música brasileira, sua religião, conhecido por suas letras carregadas de crítica social e reflexões profundas sobre a realidade e vivência negra, como mostra na introdução do show, com depoimentos de pessoas negras explicando como é difícil falar “eu te amo”, com a música “Imortais e Fatais 2” – primeira vez que a canção é tocada em algum show, mesmo que apenas em gravação. Baco é ovacionado quando entra cantando “Sinto Tanta Raiva”, que abre o show de maneira comovente com uma reflexão sobre o amor e a revolução que ele representa, contrastando com a realidade de violência e opressão. Mantendo a sequência do novo disco, a faixa “Dois Amores” traz os clássicos atabaques da religião afro-brasileira e a introdução do ponto de Pomba Gira “Dói Dói Dói Dói” para refletir sobre as dores do amor.

No maior momento de sua carreira, o artista baiano mantém o título de rapper, com uma apresentação típica do estilo, salvo os músicos que o acompanham e as backing vocals poderosas do estilo R & B, representadas por Bibi Caetano & Aisha Valdoni. O destaque de Baco Exu do Blues é sua sonoridade forte do Blues e R&B em tom bem sensual, misturado com as batidas de hip hop como em “Mulheres Grandes”, “Samba em Paris”, música em parceria com a Gloria Groove, canção do novo disco ‘QVVJFA’, que é cantado quase na sequência, intercalando com os clássicos da carreira como a famosa “Me Desculpa Jay-Z”, clássico do álbum Bluesman (2018).

O grupo majoritariamente jovem – conhecidos como “facção carinhosa” – foi um show à parte, cantando todas as canções e indo ao delírio quando o rapper apresentou outras canções que viraram sucesso, como “Te Amo Disgraça”, que integra o álbum Esú (2017), “Girassóis de Van Gogh” e “Flamingos”, do álbum Bluesman (2018). O calor do público unido a uma apresentação hipnótica disfarçou o vazio da casa, que diferente de outros shows, não teve sua lotação máxima, mas quem esteve presente saiu de alma lavada e a sensação de começar o ano com o que já pode ser considerado um dos melhores de 2024. Na faixa “Inimigos”, do novo álbum, há uma introdução da canção “Tenha Fé, Pois Amanhã Um Lindo Dia Vai Nascer” do grupo Os Originais do Samba, e nesse momento Baco convida o rapper Young Piva para um dueto.

No meio do show, o telão mostra imagens de diferentes figuras da resistência negra como Elza Soares, 2PAC, Linn da Quebrada, Sabotage, Nelson Mandela, Marielle Franco, entre outros, ao som da citação presente na música “BB King”, do álbum Bluesman (2018) – disco que reflete profundamente sobre racismo -, que explicita a relação da cultura negra com a música blues, e a sua importância para a construção de uma identidade coletiva, onde se ouve: “1903. A primeira vez que um homem branco observou um homem negro, não como um um ‘animal’ agressivo ou força braçal desprovida de inteligência. Desta vez percebe-se o talento, a criatividade, a música! O mundo branco nunca havia sentido algo como o blues”. Por curiosidade, quem esteve na exposição ‘B.B. King: Um Mundo Melhor em Algum Lugar’, no Museu da Imagem e do Som irá entender muito o conceito dessa canção. Essa foi a introdução para a faixa-título “Bluesman”.

Baco Exu do Blues cria uma verdadeira experiência única de música ao vivo, com um sentimento de comunidade sempre presente, uma homenagem aos seus ancestrais, além de uma aula que é reforçada com falas durante o show com mensagens do que trata em suas músicas. Este show exala amor, sentimento que é utilizado por Baco como fio-condutor para uma reflexão profunda sobre o racismo, e mesmo com um tema triste, Baco tem o dom de transformar sua mensagem em arte e penetrar na mente de quem o escuta. Impossível presenciar um show do Baco Exu do Blues e não sair com um misto de reflexão e ecstasy.

Confira as fotos tiradas pelo nosso colaborador Thiago Vidal: