A cantora e compositora Priscila Tossan cria, espalha e inspira com sua arte há algum tempo, desde apresentações no metrô do Rio de Janeiro, as semifinais do programa The Voice Brasil até o palco Sunset do Rock in Rio ano passado, ao lado do técnico Lulu Santos e de Silva. E na última sexta, 21, o primeiro disco da carioca, Iceberg, via Universal Music, foi compartilhado com o mundo em grande estilo.
Para entender as raízes da sonoridade que mescla MPB, samba, reggae, rap e até o jazz presentes no álbum, a resposta vem de dentro de casa, e mais especificamente, da mãe de Tossan, como ela afirma em entrevista ao Mad Sound. Segundo a artista, sua mãe participava de um coral, e com isso a apresentou nomes de Chico Buarque a Ray Charles, “Só mestres, só monstros!”, ela exclama.
Tais influências já aparecem desde os projetos prévios de Priscila, como o EP Céu Azul, de 2017, e Cine Odeon, desse ano, mas independente de referências sonoras, o modo de pensar e criar uma coleção de faixas, agora como um disco, é um processo novo e, segundo a cantora, muito melhor. “Gravar disco é paraíso. A onda de você passar o dia inteiro produzindo, ganhando ideias de grandes professores como Alexandre Kassin, e ver sua parada ganhando forma, tomando cor… Eu não imaginava que iam ser essas canções no primeiro disco não. Até pq eu sou muito… díficil assim, ‘po, isso não tá bom, vamos tentar uma outra onda, vamo deixar essa de lado, vamo fazer outra coisa…’, mas assim, acho que tinham coisas que eu não tava enxergando, e aí quatro, cinco pessoas falando a mesma coisa eu fiquei ‘Tem alguma coisa errada, (risos) vou ver qual é’. E foi bom ouvi-los, não me arrependo de nada, acho que era realmente assim o que eles tavam falando e eu não enxergava por ser tão exigente…”
“Mas cara [estou] feliz com disco! Ansiosa pra fazer um outro ano que vem e tô feliz, não mudaria nada, estou totalmente realizada, ter o Luiz Melodia que eu sempre quis, fazer uma regravação do Cartola, produção de peso com todo cuidado da gravadora”, conta Tossan, animada.
A intrisecidade de Tossan com a música é algo notável ao conversar com ela, e ao questionar a respeito do contraste de suas músicas, que em sua maioria, possuem uma atmosfera quente, quase solar, com o título do primeiro disco, Iceberg, a afirmação se torna mais nítida, e clara como o gelo. “Eu me encontro muito nessa palavra, Iceberg, porque eu acho que eu tenho uma profundidade, uma complexidade muito grande com a música, tanto na melodia quanto nas notas, nas composições. Então eu tento mostrar assim a profundidade do que eu sou, nas composições, nas coisas que eu penso mentalmente, mas eu só consigo mostrar a ponta.”
O título do disco também vem de uma das canções dele, que segundo Priscila, foi escrita de um jeito muito natural ao lado de dois amigos compositores e instrumentatistas do bairro em que foi criada, e até hoje, o trio se encontra mensalmente para compor.
Falando em criar coletivamente, “Libélulas”, o primeiro single de seu álbum, foi concebido em conjunto com amigos e grandes mestres da música, como Criolo, Luccas Carlos e até um vizinho da cantora. “Cara, eu sempre quis colocar um rap em algum single meu, em algum disco, porque é algo que eu ouço muito, tem influência também. Essa música foi um freestyle com um amigo vizinho aqui, ele tocando e eu ‘Po, isso aí tem letra?’ ai ele ‘Po, não tem letra’, dai peguei um papel e automaticamente foram surgindo as ideias, e surgiu ‘Libélulas'”.
“Foi mágico, Criolo é mestrão né, e o Luccas tem se tornado um querido, a gente tem se falado diariamente praticamente, sempre escutei as canções dele, as paradas dele, e o Criolo já tava na música, mas eu queria colocar mais um. E eu pensei no Luccas, e ele no maior carinho do mundo no dia seguinte já foi trabalhar na música, e completou assim sabe, queijo e goiabada! Tudo que eu queria que ele falasse ele falou, e atingiu, sei lá, três vezes mais a minha expectativa sabe? Lindíssimo!”, compartilha.
Como se já não bastava grandes parcerias na canção, o conteúdo dela a deixa mais especial ainda, como Priscila conta, “Eu acho que ‘Libélulas’ não fala só de sonho, acho que ela fala da pele negra também né? Essa coisa da gente sonhar e não ter voz, mas ter uma janelinha. É muita luta, mas eu acho que o sonho ele faz a gente querer seguir mesmo, o sonho é uma parada que te leva”.
Mesmo jovem, Tossan já possui momentos, lembranças e marcos notáveis em sua carreira, mas pensando no futuro, a questiono dos sonhos, das “Libélulas” restantes para ela conquistar, que responde de maneira inusitada e genuína, “Ah… acho que meu jipe! (risos) Acho que só , e ter um mini estúdio dentro de casa, não quero ter coisas imensas não, só meu mini estúdio em casa e meu jipe velhão!”
O caminho percorrido por Priscila com certeza a ensinou e irá ensinar muito ainda, e com isso, a artista se torna uma referência para os que a acompanham e, principalmente, para todas as jovens artistas negras que sonham em ver sua arte em grandes lugares, para elas, Tossan oferece um conselho, mas avisa, que não tem muito glamour em seu aconselhamento, afirmando, “Acho que é só você seguir mesmo, acho que Papai do céu abençoa, se você honestamente seguir seu sonho e de pouquinho em pouquinho ver o que você consegue fazer, eu acho que é isso, quanto mais luz você buscar, mais luz você encontra, honestidade e busca, Papai do céu abençoa.”