5. The Microphones: Microphones In 2020

Um suspiro em meio ao caos: material inédito do The Microphones em 2020. Como a própria arte do disco indica, Microphones in 2020 é um exercício de Phil Elverum de conceber toda uma existência como espectador e protagonista. 

Em um mergulho profundo em como o The Microphones foi idealizado e seus primeiros passos, Phil Elverum apresenta uma vida sem se preocupar com linearidade. Ouvir este disco é uma experiência similar a ler as obras literárias mais recentes de Patti Smith, em que o presente se mistura com o passado e tudo parece etéreo, como um sonho. 

O verdadeiro estado de todas as coisas é uma cachoeira”, canta Elverum, em uma tentativa de apresentar sua interpretação da realidade. O canto autobiográfico é acompanhado por uma hipnótica melodia de violão, que apesar de se manter constante por quase os 45 minutos completos do disco, às vezes se esvai. Em adição aos dois acordes que carregam a canção, novas texturas surgem, como linhas de baixo distorcidas, ruídos analógicos e outros elementos. Afinal, a permanência não passa de um sonho ao qual se agarrou. 

Não existe fim”. Verso repetido ao longo de Microphones in 2020 é a promessa de Phil Elverum para sua arte e vida. A ciclicidade é um sintoma da vida humana e nos resta ter coragem e enfrentar a incerteza universal.  

4. Perfume Genius: Set My Heart On Fire Immediately

Se existisse uma categoria entre os humanos que nos classificasse como “humanos demais”, Perfume Genius, nome artístico de Mike Hadreas estaria nela. Set My Heart On Fire Immediately, seu quinto e mais recente álbum de estúdio, é um lembrete para desacelerarmos e olharmos para dentro. 

O artista compartilhou que, antes da produção do álbum, participou de uma série de apresentações de dança moderna, experiência perfeitamente transposta nas canções. Sensual e dramático, é um álbum para ser dançado. 

Os suspiros entre notas e a percussão que mais parece um coração pulsando nos lembram que Mike Hadreas é humano, e nós também. Temos um corpo físico e além do sangue, em nossas veias corre sensibilidade e delicadeza. 

O grande feito de Set My Heart On Fire Immediately é transmitir proximidade em um ano marcado pelo distanciamento social. Abordando temas como o movimento, toque, corpos e intimidade, Mike estabelece uma conexão real com o ouvinte. Sorte a nossa.

3. Mateus Aleluia: Olorum

Riscar mais um mês difícil no calendário. Mais 30 dias no vazio em que as horas se confundem com os minutos e com elas levam uma imensa saudade. De onde tirar forças para enfrentar o que não sabemos quando vai acabar?

Dois lançamentos nacionais me acompanharam ao longo de 2020 e me lembraram que há muito a viver ainda. Se um disco pudesse abrir o tempo e chamar o Sol para perto, Olorum, terceiro álbum de Mateus Aleluia em carreira solo, o faria. 

Ó, Deus, meu pai / Parai a mão do opressor / Calai a voz do enganador / Fazei chover só chuva de amor“, canta em “Samba-Oração”, uma das principais canções do álbum. Em um cenário de instabilidade política, intolerância religiosa e pandemia, Mateus Aleluia oferece coragem para quem ouve, e muita esperança. A composição “Liquefez” é um hino para quem entende que crescer é errar e aprender. “Aprendi que com essa idade ainda sou criança”, canta com delicadeza e sabedoria.

3.1 Jup do Bairro: Corpo Sem Juízo

Destaco, além do inspirador Olorum, um EP que se confirmou fonte infindável de disposição e solidariedade. Falo da estreia de Jup do Bairro com o estrondoso “Corpo Sem Juízo”, primeiro trabalho de estúdio da multiartista de São Paulo. 

Rico em colaborações, o EP conta com produção da talentosíssima BadSista e participações de nomes como Rico Dalasam, Linn da Quebrada, Mulambo e Deize Tigrona. Com a última, interpretou “Pelo Amor de Deize”, canção que evidencia a versatilidade de Jup, que em sete faixas transitou pelo funk, R&B, pop eletrônico e hard rock.

Corpo Sem Juízo é o registro mais punk de 2020. 

2. Dogleg: Melee

Indo contra e todo qualquer argumento de que o emo está morto, a banda americana formada em Detroit, Dogleg faz sua estreia com o impressionante Melee. Com tudo o que um fã do gênero pode pedir, o disco é recheado de guitarras intensas, bateria rápida e bastante gritaria, além de letras cruas e intimistas. 

Como os contemporâneos Oso Oso e Joyce Manor, Dogleg se apresenta sem esconder inspirações vindas dos anos 90 e começo dos anos 2000, épocas em que o emo e post-hardcore foram gigantes. 

Com as medidas de prevenção ao Covid-19 implementadas, casas de show tiveram as atividades interrompidas por tempo indeterminado e os fãs de música ao vivo foram deixados sem o passatempo favorito. Com Melee, é fácil se sentir transportado para uma casa cheia, regada a suor e abalada por moshes insanos. O paraíso de muitos.

Falaremos sobre esse disco daqui algumas décadas com o mesmo entusiasmo que falamos de clássicos como Diary, do Sunny Day Real Estate e Nothing Feels Good, do The Promise Ring, por exemplo.

1. Fiona Apple: Fetch The Bolt Cutters

Muitos esperaram a meia noite do dia 17 de abril como crianças esperam a noite de Natal. A certeza de um presente foi confiada à Fiona Apple que, há muitos anos reclusa, prometeu lançar um novo disco, sequência ao aclamado The Idler Wheel Is Wiser than the Driver of the Screw and Whipping Cords Will Serve You More than Ropes Will Ever Do, de 2012.

Inspirada por uma fala da personagem interpretada por Gillian Anderson na série The Fall, a cantora e pianista intitulou seu quinto álbum de estúdio Fetch The Bolt Cutters, trabalho que já nasceu como um clássico. 

Como o próprio título sugere, é hora de Fiona “pegar os alicates”. É hora de se libertar do passado, processar traumas e encarar novas experiências. Sempre aberta e um pouco caótica, a artista compartilha vivências de infância e da vida adulta, que vão desde bullying na escola até relacionamentos desastrosos. 

Autêntica e imprevisível, a cantora e pianista não se prende a nenhuma ideia pré-concebida de como um álbum deve ser gravado e produzido. A instabilidade que a cerca é seu grande trunfo, e os seus cachorros são a participação especial perfeita para um registro tão íntimo, tão Fiona Apple. 

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