“Quando eu tinha 24 anos, eu decidi me reinventar completamente”. É assim que Taylor Swift abre o prólogo datilografado no encarte de seu álbum mais recente, 1989 (Taylor’s Version)

O lançamento é mais uma regravação da cantora na jornada de recuperar a autonomia sobre sua discografia álbum a álbum (seus seis primeiros álbuns foram vendidos em 2019 para o empresário Scooter Braun). Até o momento, já foram regravados e lançados os discos Fearless (Taylor’s Version), Speak Now (Taylor’s Version) e Red (Taylor’s Version).

Conhecida por ser uma cantora e compositora que imprime muito da vida pessoal em sua arte, Taylor construiu ao longo de sua carreira uma discografia que vai além da música; seus álbuns são quase como diários, documentando histórias, momentos e sentimentos de determinados períodos de sua vida. É como se cada álbum contasse a história completa de uma fase vivenciada e o próximo chegasse com uma narrativa completamente nova.

Nesse sentido, o 1989 foi um dos projetos mais emblemáticos e marcantes da carreira – e da vida – de Swift. Em uma realidade onde vida e arte se misturam ao invés de se imitarem, a cantora realizou todas as mudanças que achava necessárias em sua vida pessoal e em sua imagem midiática e oficializou essas mudanças também na música, abandonando completamente as raízes no country para seguir um novo caminho na música pop.

Ao pensarmos no 1989 é fácil cair na obviedade de enxergá-lo como mais um álbum contando as aventuras e desventuras de um relacionamento que não acabou bem. Músicas como “Style”, “Out of the Woods” e “Wildest Dreams” constroem a narrativa de uma relação que durou pouco, porém o suficiente para deixar marcas, e são o ponto alto de um disco que consegue ser, ao mesmo tempo, alegre e sensível, esperançoso e melancólico.

Mas em sua essência, o álbum fala sobre muito mais do que isso. Ambientado em Nova York, ele conta a história de como Taylor Swift se mudou para uma cidade grande pela primeira vez, reinventou seu visual e sua sonoridade, fez novos amigos e, acima de tudo, aproveitou sua juventude. Tanto na celebratória “New Romantics” – (“Somos tão jovens / Mas estamos na estrada para a ruína”) – quanto na faixa inédita “‘Slut!’ (From The Vault” – (“Ser jovem assim é arte”) – Swift explora sua idade como sinônimo de liberdade, no maior estilo de “viver enquanto se é jovem”.

Beirando os simbólicos 25 anos na época em que o disco foi gravado, Taylor decidiu usar sua idade como armadura para se proteger das críticas e ataques da mídia em relação à sua vida pessoal. Na época, a pouca durabilidade de seus relacionamentos públicos tinha virado alvo de piada e reprovação na mídia internacional – e uma imagem negativa relacionada ao número considerado extenso de seus relacionamentos tinha começado a se formar.

Hoje em dia a cantora usa termos como “slut shaming” para se referir ao comportamento externo em relação a ela na época. Em 2014, pouco se debatia amplamente sobre machismo e menos ainda sobre o fato do mesmo comportamento não ser repudiado em homens. Em faixas como “Blank Space” e “Shake It Off”, Taylor retoma o controle dessa narrativa deturpada e reforça mais uma vez seu direito de explorar sua vida amorosa sem culpa – porque, afinal de contas, ela era jovem e tinha todo o direito de viver essas experiências.

Exatos 9 anos depois, o 1989 é relançado em meio a um contexto interessante. Após o fim de um relacionamento de 6 anos, a vida amorosa de Swift voltou a ser de interesse público e alvo de especulações – já fazem algumas semanas que o mundo não tira os olhos de um suposto romance entre ela e o jogador de futebol americano, Travis Kelce. Nesse sentido, o álbum serve para lembrar o público de que explorar as possibilidades amorosas sem medo, culpa ou vergonha ainda é um direito da cantora. Mais uma vez, o 1989 aparece como um respiro de vida depois de um longo período de mágoas e dúvida.

Sonicamente, a nova versão do disco consegue elevar o 1989 ao maior patamar de seu potencial. Com mixagem mais nítida e minuciosa que o original, o disco ganha novas camadas sonoras e nos leva por um universo caleidoscópico de cores, sons e sensações que se perderam na pós-produção compacta de sua primeira versão. Tantos os vocais de Swift quanto os arranjos instrumentais se destacam individualmente, se entrelaçando de maneira expansiva e prazerosa, especialmente em faixas como “Blank Space”, “Style”, “I Know Places” e “All You Had To Do Was Stay”.

Enquanto as faixas originais brilham em seu novo trabalho de pós-produção, as músicas inéditas “from the vault” soam meio apagadas em meio ao quadro geral do álbum. Assinadas por Jack Antonoff (e co-produzidas pela própria Taylor), as novas faixas destoam um pouco da atmosfera estridente e festiva que permeia o 1989. A produção minimalista e mais moderna lembra os trabalhos da dupla no álbum de inéditas mais recente de Swift, Midnights (2022). Liricamente, porém, Taylor traz novos insights sobre o relacionamento que inspirou a linha do tempo contada no 1989, acrescentando novos detalhes como a falta de reciprocidade em “Say Don’t Go” e amores paralelos em “Is It Over Now?”.

Em 2023, o 1989 surge novamente para lembrar a nós – e à própria Taylor – a importância de sempre se reinventar, diminuir um pouco o volume do mundo lá fora e tentar se divertir o máximo que puder. Mais do que uma história de decepções e corações partidos, o disco fala sobre recomeços, novos amores e a coragem de sempre tentar de novo, independente do resultado final. Mais do que um álbum sobre relacionamentos, esse é um álbum sobre a descoberta da própria identidade e a vontade incontrolável de viver algo novo.