Se nada parece fazer muito sentido, é porque talvez não faça mesmo, Mas isso não impossibilita o nascimento de um dos melhores discos do ano, a estreia de Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo, lançado no último dia 9, via RISCO.

Entrando em contato pela primeira vez com o álbum na audição do projeto via Zoom, foi impossível não ficar emocionada e orgulhosa como uma mãe (mesmo possuindo a mesma média de idade dos músicos) vendo Sophia Chablau (voz e guitarra), Téo Serson (baixo), Theo Ceccato (bateria), e Vicente Tassara (guitarra e teclados), compartilhando o disco poucos antes do dia de lançamento, contando com três rodadas de audição, já chegando ao mundo com um selo de qualidade até nos bastidores. “Eu diria até em um certo sentido que foi o momento mais emocionante. O momento de lançar o disco, e ver a galera falando sobre foi super emocionante também, mas encontrar todo mundo, desde gente que trabalha junto, desde gente que te viu desde que você é muito pequeno sabe? E também conhecer pessoas novas como você!” , conta Theo em entrevista ao Mad Sound ao lado da banda, e é complementado por Sophia, compartilhando que a banda ouviu poucas vezes o disco juntos, então estar ali com eles deixou a experiência mais marcante ainda.

O evento, que também contou com a presença de Jadsa, Luiza Lian, Pedro Pastoriz, Lucinha Turnbull, a primeira guitarrista brasileira que colabora com um solo em “Moças e Aeromoças”, e é claro, de Ana Frango Elétrico, responsável pela produção do álbum, se tornando peça fundamental para a confiança da banda em lançar seu primeiro disco, e na concepção do mesmo, com destaque para um dos (vários) pontos fortes do álbum: sua diversidade sonora com um percurso pra lá de dinâmico para o ouvinte. “Isso foi bem decidido, isso foi mesmo uma coisa muito bem pensada… A gente fez uma reunião com a Ana, se juntamos na casa do Théo, e ela falou que a gente tinha que pensar o disco como um todo, e surgiu essa ideia de fazer um lado A e um lado B, pensar como um vinil mesmo. E então pensar no momento que acontece no interior de cada um dos lados…”, revela Vicente até a conversa ser interrompida por uma mulher misteriosa no portão que pede, de braços cruzados, o dinheiro da passagem. Após a interrupção dramática (mas muito bem humorada), Vicente retoma: “Foi uma das situações mais conflituosas, de como fazer essa ordem.”

Protestando contra o pensamento inicial da banda de posicionar a delicada “Se Você” como abre alas do projeto, Frango Elétrico recomendou começar o disco com o pé na porta, afinal eles eram uma banda. Com isso, o grupo constatou a presença de dois tipos de música muito diferentes, e com isso, duas opções de caminho: fazer um disco meio termo, ou intensificar sua polarização. Como uma banda que descreve o próprio som e espírito de vida como alucinante, eles, é claro, escolheram a segunda opção. O resultado foi um disco cíclico cheio de altos e baixos picos de energia, e encerrando com “Delícia/Luxúria”, como tudo começou: com não apenas um, mas com dois pés na porta em “Pop Cabecinha”.

Mas como surge um som alucinante e polarizador, como presente no disco? Primeiro, segundo a banda, possuindo muito pouco tempo em mãos para criar a grande maioria das canções, como conta Sophia, compartilhando que a banda teve cerca de nove dias para preparar as faixas em 2019, tendo em vista que iriam tocar seu primeiro show em breve.

Em segundo o lugar, também ter diversas referências, entre elas My Bloody Valentine, Pixies até Caetano Veloso e Os Mutantes, e pensando na sonoridade e estilo de cada grupo para uma faixa especial, pensar que tal canção “vai ser igual” uma faixa da banda em questão (como o meme daquele cara apontando para um mural de evidências sobre uma teoria de conspiração), e no final, constatar que não ficou nada parecido, e tudo bem!

O processo de criação da banda parece similar ao tentar fazer uma sopa com vários ingredientes e uma receita, mas no final, de alguma maneira, o prato não tem o mesmo gosto que o imaginado, e a partir disso, temperos diversos entram em ação finalizando a mágica do grupo, que pensam cada faixa “no máximo de sua potência e de sua estranheza”.

Um dos exemplos dessa máxima é a sexta faixa do projeto, “Hello”, composta por Chablau, “Essa música eu confesso que eu não sei o que eu estava usando na época, eu não lembro muito (risos)”, revela sobre a canção “bilíngue” que trata sobre o eterno (e frouxo, em suas palavras), debate sobre o que é música brasileira e o que não é. “Mas eu lembro de escrever essa letra há bastante tempo, e foi uma das poucas músicas que eu escrevi uma letra gigante e deixei no bloco de notas no meu celular (…) Aí um dia, eu fui falar com um amigo que eu tinha escrito essa música e ai eu não tinha uma harmonia pra botar junto, e aí eu acabei tocando uma música que eu tinha aprendido, e cantei a música pra mostrar. E aí virou a música!”, o resultado, foi a letra mais agressiva do disco com uma melodia paradisíaca de bossa nova, intensificando a natureza passiva agressiva da canção, que segundo a banda, chegou “imexível”: toda a estranheza, potência e contraste dela já estavam ali.

A habilidade de juntar tantas coisas visando um resultado satisfatório, tão pouco tem a ver com sorte, e mais com a experiência musical da banda, em que Theo e Téo se conhecem desde os 7 anos de idade, e desde então possuem “bandas desde os 7 anos de idade, umas imaginárias, algumas reais”, contam. Antes de se juntarem com Sophia como banda de apoio e eventualmente se tornarem um grupo, Theo tocava com Vicente, e até com Chico Bernardes na banda Fernê, e já havia tocado com Chablau, como se os músicos estivessem separados mas juntos, só esperando a hora certa de se unirem de vez.

E é essa tal união estratosférica que será apresentada ao vivo hoje, 22, às 20h, no o show de lançamento do disco, via Itaú Cultural. Para se preparar para o lançamento, a banda se reuniu por duas semanas nos fundos da casa de Sophia para, entre aulas do EAD, ensaiarem (e muito!) para o show. “A vibe que a gente tá é muito boa, porque no fundo é a vibe que a gente sempre esteve pra fazer as coisas rolarem (…) A gente fica ansioso juntos, fica nervosos juntos, sofre juntos”, conta Chablau, e Théo complementa. “Sabemos que pra fazer uma live tem que ser tão bom quanto um show, mas bom em outros sentidos… É importante ter uma coerência visual, estética que não seja algo que a gente faz porque a gente tem que fazer.”

Em meio de incertezas mundiais, mas de diversos momentos especiais diante a resposta positiva do disco por parte do público e crítica, a banda possui sonhos alucinantes sobre o futuro, já planejando muitas coisas além do disco. Mas ressaltam que o verdadeiro sonho da banda já está se concretizando, e contrariando o que muitos podem pensar do que é um sonho para artistas, para Sophia Chablau e Uma Enorme Perda de Tempo, vai além do sucesso comercial das obras. “A gente têm uma ansiedade por virar, mais no sentido mais profundo da coisa, da música, de tocar, de estar nesse lugar, e que na verdade é importante enfim, mas tem uma coisa que já virou assim no sentido da nossa relação entre nós quatro, das nossas preocupações musicais, do que a gente tá querendo construir juntos”, compartilha Sophia. “Nesse sentido, o sonho, um dos sonhos, a gente já tá vivendo o sonho. A gente tem uma banda que a gente ama, a gente super se dá bem, a gente tem um disco que a gente ama (…) O nosso ‘dar certo’ é ter virado uma banda, não ser mais um projeto, estamos muito felizes de ser uma banda.”

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