2020 foi um ano excepcional para o Pop. Apesar de todas as partes ruins que aconteceram durante o ano, muitos artistas se viram forçados à introspecção para escrever e produzir novos álbuns. Com o K-Pop, foi diferente.

Aos que não conhecem o gênero, saibam: não é o grupo em si que escreve e produz suas músicas. Pelo menos não são todos os grupos que fazem isso, havendo exceções (sim, o BTS escreve). Mas há mais no K-Pop do que a música em si. Coreografia, conceito sonoro, produção imagética e por aí vai. E a partir disso, pode surgir um álbum interessante, com detalhes intrínsecos da empresa de entretenimento por trás dos grupos.

Desde 2017, o trend da volta do retrô tomou conta do K-Pop. Belíssimas produções como “Oh! My Mistake” de April, “Where Are You” de CLC, “WooWoo” de DIA e “Heroine” de Sunmi praticamente passaram despercebidas nos charts coreanos e nas críticas. Eu gosto de dizer que as empresas vão testando as águas dos estilos para saber o que entregar aos fãs mais tarde. O primeiro exemplo é o maior deles. Com uma recepção positiva perceptível, mas atrasada e nichada, April não voltou mais com 80s. Já outros grupos…

Este ano, tanto grupos femininos como masculinos do K-Pop alcançaram o pico do trend, com “Dynamite” do BTS sendo o extremo do que vai chegar por hora. Entretanto, como sou especialista em girl group, vou focar só nelas. 

Meus cinco álbuns favoritos vieram todos no segundo semestre de 2020, quando o K-Pop já tinha se acostumado com os protocolos de Covid-19 e separado o orçamento para fazer mais um comeback antes de sair uma vacina.

5. Everglow-77.82X-78.29

O conceito é Sin City. Com o segundo comeback do ano, Everglow chegou com um verdadeiro retro synthwave inspirado nos anos 80s com uma virada sombria e misteriosa, como é possível de ver no vídeo da title track, “LA DI DA”. Conforme foi feito nos mini álbuns e singles passados, Everglow vem com músicas hard hitting, com onomatopeias no refrão prontas para grudar na sua cabeça. Em “LA DI DA”, há um elemento ainda mais pancadão do que o normal, que suaviza durante as partes de rap. Mas em momento algum aquele sentimento que foi feito propositalmente para transferir o conceito visual de Sin City para o sonoro some.

Em “UNTOUCHABLE”, o elemento 80s fica ainda mais forte. Os vocais são mais suaves, a música fica mais groovy. A impressão que deixa é que o ouvinte ainda está dentro de um filme, numa discoteca antiga. Com “GxxD BOY”, voltamos a modernidade, com um baixo tomando conta da melodia que mostra como a música, combinada com a letra (“I’m in love with a good boy”) e os vocais aspirados resultam numa canção sexy. A última do mini álbum, “NO GOOD REASON”, já foca nos vocais e nos tons altos que as integrantes conseguem alcançar. É a única que destoa do conceito até então, mas é a canção que eu gosto de chamar de “sentimental/ballad obrigatória”, que nem sempre se encaixa, mas é obrigatória para os ouvintes coreanos que amam o estilo.

4. ITZYNot Shy

ITZY é o segundo e mais recente grupo feminino da JYP Entertainment e desde sua estreia, em fevereiro de 2019, deu o que falar. Elas se apossaram radicalmente do conceito teen crush – um girl crush menos sexy, mais colorido e mais experimental – e assinaram embaixo em literalmente todos os lançamentos desde então. “Not Shy”, como title track, não é diferente. A letra é cheia de confiança, mas com um tom um pouco mais romântico. Ela é o que se espera de ITZY e é o que as integrantes fazem tão bem.

O mini álbum, entretanto, ficou em quarto lugar por uma grande virada do destino que foram as canções “Surf” e “Be in Love”. A primeira, que maximizou os vocais das integrantes numa vibe californiana impecável sem o batidão usado de novo e de novo, foi uma inovação tremenda para um grupo como ITZY. Não é uma ballad, mas é significamente uma quebra de ritmo muito mais que bem vinda em Not Shy. A segunda também é uma grande mudança, com uma guitarra no plano de fundo acompanhando a canção inteira em conjunto com um violão. Novamente, não a sua típica ballad coreana, mas calma e tranquila. A mudança de fluxo das canções de ITZY não significa qualquer alteração de conceito pelos próximos anos, afinal, vimos o mesmo padrão de comportamento com todos os grupos que saíram da JYP. Mas é bom saber que existe a possibilidade de algo novo e fresco.

3. GFRIEND回: Walpurgis Night

O terceiro álbum lançado do ano, após 回: Song of the Sirens e 回: Labyrinth, 回: Walpurgis Night chega para encerrar o quinto ano de carreira de 여자친구 (Girlfriend, na tradução literal para inglês e estilizado como GFRIEND). Como veteranas numa indústria onde a maioria dos contratos acabam no sétimo ano, as integrantes do grupo já alcançaram o direito de colocar suas personalidades nas músicas que estão fazendo. Na saga 回 (símbolo sino-coreano para o verbo girar), as integrantes são creditadas como liricistas, inédito até então, mostrando que ganharam espaço para crescer musicalmente e como artistas. A title track “MAGO” traz o elemento 80s também, de forma mais disco. Talvez um dos pontos mais únicos sobre essa canção é que ela evoca melancolia. Na verdade, para quem já ouviu GFRIEND, pode reconhecer o sentimento durante toda a carreira delas. Às vezes, a letra demonstra e às vezes, é o quarteto de cordas no fundo que dá o tom da música inteira. 

Em Walpurgis Night (também conhecido como o Festival das Bruxas no norte da Europa), a magia continua com “Love Spells”, com a melodia leve cercada de guitarras e bateria, os vocais aspirados trazem uma maturidade para o grupo que foi pouco explorado em conceitos anteriores. Em seguida, com “Three of Cups”, a letra é realmente relacionada com a carta de tarô 3 de Copas, que representa amizade, celebração e amor. Combinada com o groovy, a canção se torna facilmente a mais encantadora do álbum. “GRWM” já mostra um eletropop com simbolismo de crescimento na letra. As três faixas seguintes foram feitas em duplas, sendo a primeira vez que GFRIEND se divide em units. Em geral, o álbum demonstra uma nova imagem para o grupo, trazendo uma experiência excelente para os fãs e ouvintes casuais de K-Pop.

2. LOONA12:00

Eu não poderia assinar esse texto se não incluísse elas. O terceiro mini-álbum de LOONA veio em um momento muito propício para os fãs. Com problemas administrativos na empresa, a falta de um diretor de criação, com uma integrante a menos se tratando por ansiedade e em hiatus por quase um ano, 12:00 (ou Midnight) caiu como uma luva para quem estava achando que LOONA não voltaria novamente em 2020. Este é o segundo mini álbum com a direção de Lee SooMan, fundador da SM Entertainment, uma das empresas mais antigas na indústria de K-Pop. Apesar de haver muita crítica por parte da direção dele (muitos fãs não gostaram da mudança súbita da sonoridade do grupo que veio em fevereiro com [#]), Midnight vem numa produção impecável, como se contasse uma história onde todas as faixas se encaixam – quase – perfeitamente. Como title track, “Why Not” não é o ideal, mas não deixou a desejar. Os fãs continuam vendo a versatilidade do grupo, dessa vez com muito rap e um refrão chiclete perfeito para subir nos charts. E não é pra menos, a faixa alcançou o 112º lugar no chart 200 da Billboard, feito pouco realizado por artistas coreanos. 

O pico do álbum é “Voice”. Com uma melodia doce e focada na performance vocal, a b-side volta para o som de assinatura de LOONA. Com uma versão em inglês chamada “Star”, existem duas narrativas diferentes na mesma batida de synthpop, altamente elogiadas pelos fãs. E como se não bastasse, em “Universe” voltamos para a era de “Butterfly”, lançada no início de 2019, com o dreampop. Sem precisar se preocupar com coreografia, as integrantes colocam todo seu potencial e técnica vocal na canção, feita para ser cantada no final de um show com as doze meninas sentadas de frente para os fãs. Com tantas mudanças dentro do espaço de um ano, não dá para saber o destino musical do grupo, mas certamente esperamos o inesperado e é isso que torna tão excruciante a antecipação de um comeback de LOONA.

1. TWICEEyes Wide Open

Com o passar dos anos, TWICE se transformou como grupo. Desde o intenso viral de “Cheer Up” até “More & More”, muito (e eu realmente quero dizer muito) mudou. Mas não de uma vez. Não com um impacto profundo. De pouquinho a pouquinho, a JYP Entertainment foi alterando a direção sonora do grupo para um novo caminho sem assustar ninguém. Ninguém vive de conceito fofo pra sempre, principalmente depois que não tem mais menor de idade no grupo para carregar o aegyo nas costas. 

Eyes Wide Open é a culminância perfeita de TWICE no tom maduro que elas sempre mereceram. Esse é o segundo full álbum do grupo e o primeiro desde 2017. Além disso, é a celebração de cinco anos de carreira das meninas. “I Can’t Stop Me” é o único synthwave 80s inspired que poderia sair da JYP. 

Para contextualizar: o primeiro grupo feminino da empresa, Wonder Girls, era conhecido por apenas fazer conceitos retrô. Reboot, o último full lançado por elas em 2015 no oitavo ano de carreira, considerado por muitos entusiastas de K-Pop um dos melhores álbuns do gênero dos últimos dez anos, é o 80s ideal.

Eyes Wide Open é o Reboot de TWICE. A diferença entre os dois é gritante, mas o que é essencial permanece: uma produção limpa, direta ao ponto, sonoramente alinhada com o que TWICE tem se proposto a fazer. “I Can’t Stop Me” é a title que apresenta o álbum de forma mais comercial, enquanto as b-sides fazem todo o trabalho. Em especial, “Up No More” e “Say Something”, ambas baseadas em City Pop, carregaram o álbum para outro patamar. As duas são lados da mesma moeda, uma puxada mais pro groovy e disco, enquanto a outra te faz sonhar com um passeio nas ruas da noite de Tokyo com cores neon em todos os lugares e o rádio tocando aquela guitarrinha. Não sabe qual guitarrinha é? Dá play em “Say Something” e saberá.

Outras canções que trabalham duro para deixar o álbum redondo são “Believer”, “Queen” e “Handle It”. A primeira te leva de volta aos anos 90 com o assobio típico de qualquer pop que tocava na época. A segunda te leva pra dançar na discoteca. A terceira te dá o ombro  pós-término para chorar. Em geral, Eyes Wide Open abre novas portas para o futuro de TWICE. Como mencionado com GFRIEND, depois de uma certa “idade” na indústria, você ganha mais liberdade como artista, mas existem outros medos, como os temidos contratos de 7 anos, comuns entre grupos. Só se pode esperar que TWICE tenha ainda mais espaço e tempo para crescer no K-Pop. 

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