Existe algo muito bonito na forma como Samia conta suas histórias mais pessoais em seu segundo álbum de estúdio, Honey (2023). A cantora de 26 anos desenvolve em seu novo disco uma linguagem muito natural de storytelling, tecendo quadros de suas memórias como se estivesse lendo em voz alta as cenas de um filme.

Trazendo uma dose de melancolia e honestidade crua que levaram alguns portais a inevitavelmente compará-la com Phoebe Bridgers, Samia se aprofunda ainda mais no indie em Honey, preferindo em sua maioria arranjos minimalistas para dar mais destaque às suas histórias de coração partido, nostalgia, aceitação e otimismo frágil.

O álbum se inicia com “Kill Her Freak Out”, onde Samia desabafa sobre o peso de perder a pessoa amada para outro alguém de forma permanente, nos oferecendo o motivo logo na primeira linha: “Eles vão ter um filho”. Após receber a notícia, ela mesma divaga sobre um momento em sua vida em que teve um sonho sobre estar grávida e ter acordado “com a guarda baixa”. No refrão, ela despeja sua dor e frustração mascaradas pela raiva: “Espero que você case com a garota da sua cidade natal / E eu vou matá-la / E eu vou enlouquecer”, canta de maneira figurativa.

A maioria das canções do Honey são cantadas sobre memórias de Samia pintadas em cenários bastante vívidos – é como ouvir uma história de ninar, porém uma sem final feliz. Canções mais agitadas como “Mad At Me” e “Amelia” têm um apelo mais pop, mas o grande destaque fica por conta da dobradinha “Breathing Song” e “Honey”.

De acordo com a cantora, ambas as faixas pertencem “ao mesmo universo”, abordando o mesmo período delicado de sua vida. “Breathing Song” é uma canção mais crua e dolorosa, detalhando o que parece ser um episódio de abuso sexual e as consequências da violência na saúde mental de Samia enquanto ela ainda demonstra dificuldades de culpar seu abusador. O título é explicado no último verso, onde Samia relata:

“Nós tocamos no Greek Theatre / Você teria adorado / Noah disse, ‘Posso te perguntar uma coisa?’ / Então tentei contar a ele / Na maior parte pelo seu ponto de vista / E aí parei de respirar / Então fizemos um exercício / Quatro para dentro, seis para fora / ‘Samia, por que importaria o que aconteceu depois que você disse-’ / Não, não, não”.

Já “Honey” tem uma sonoridade mais dançante porque se trata da própria Samia “zombando da minha própria tentativa de convencer as pessoas que eu estava bem”. Apesar do apelo para as rádios e a melodia divertida, a cantora considera essa “a canção mais triste” que já escreveu.

Para os fãs das características mais contemplativas do indie pop, Honey é um prato cheio. Mesmo nas faixas com sonoridade mais otimista, a voz de Samia transmite seu verdadeiro estado melancólico e a dor de relembrar até as mais felizes de suas memórias, trazendo o ouvinte cada vez mais para dentro de suas histórias e tornando impossível parar de ouvir.