Texto por Joana Söt

Ontem, enquanto voltava para casa depois do aniversário do Balaclava Fest em uma noite quente, com uma estranha neblina nas ruas iluminadas por uma lua quase cheia, pensei sobre a direção que essa resenha deveria tomar.

Poderia falar sobre os shows incríveis que São Paulo recebeu durante 2022, ou ainda sobre os artistas “que ninguém conhece’’ que o Balaclava traz para o Brasil (e graças a Deus o faz!), ou mesmo fazer uma retrospectiva de todas as edições marcantes do festival do selo, mas me deparei com a vontade de escrever sobre a essência de tudo isso: sobre o que ir à um show faz com a gente.

Na comemoração de 10 anos do Balaclava Fest, no último domingo, 11, o selo, já conhecido por trazer atrações inéditas ao Brasil, se dedicou mais uma vez a agradar os amantes do “indie clássico”, sem deixar para trás a cena independente atual e local. Com dois palcos e ambientes descontraídos espalhados pela Tokio Marine Hall, o selo Balaclava mais uma vez traduziu em sons e estilos a geração alternativa nascida nos anos 90.

O festival contou com artistas nacionais revelação, como Bruno Berle, Jennifer Souza, e Pluma. Já no line up internacional, Crumb, banda americana que mescla o rock psicodélico com uma pegada lo-fi, e a banda indie canadense (praticamente) formada por mulheres, Alvvays, abriram a noite para a atração principal do festival (a qual pelo menos 80% do público ali presente estava esperando por anos), Fleet Foxes.

Como fã devota de Robin Pecknold desde meus 14 anos de idade, e tendo visto alguns shows e apresentações do vocalista no YouTube ao longo destes 12 anos acompanhando a banda norte-americana, nada me preparou para a experiência verdadeiramente alucinante de presenciar este concerto ao vivo.

De música a música, entre trocas incessantes de violão e instrumentos pelo palco, no meio de tanto talento e harmonia entre os integrantes da banda, e os agradecimentos e sorrisos de Pecknold ao público (que não escondeu a animação em receber finalmente a banda no Brasil), rapidamente a noite se transformou numa espécie de culto à beleza da simplicidade complexa da natureza e dos sentimentos humanos, e de repente já não estávamos em São Paulo, talvez nem neste mundo – e sim em alguma realidade onde todos celebram a vida junto aos campos, de pés descalços, em ciranda embaixo da lua cheia.

A sensação de estar num concerto do Fleet foxes. Crédito: Reprodução/YouTube/Clipe “Fools Errand”, do Fleet Foxes

Pecknold passeou sem dificuldade alguma por toda a discografia impecável do Fleet Foxes, com projeções mescladas entre formas arquitetônicas e planos-detalhe de riachos, flores, e rios se ajustando perfeitamente à natureza. Dentre os hits da noite, destacaram-se os clássicos: “Blue Ridge Mountains”, “Ragged Wood”, “Your Protector”, “White Winter Hymnal” e “Helplessness Blues”. Na faixa “The Shrine/An Argument”, o público abriu o coração no refrão explodindo em emoção não só pela música, mas por finalmente poder cantar alto e com vontade de estar ali, e somente ali naquele momento como se tudo em nossas vidas tivesse acontecido para a presença naquele concerto. 

O ápice da noite foi a presença do paulistano Tim Bernardes, tão declaradamente fã de Fleet Foxes quanto todos nós ali presentes, na música “Going To The Sun Road”. Notava-se a harmonia sentimental de todos da banda com todo o público, num ambiente tão íntimo em que palavras não bastam, onde só o som é capaz de traduzir algo tão lindo. E foi nessa troca tão intensa entre todos, chuva de flores em brisa de verão, entre as danças e cirandas, as risadas, as lágrimas e a natureza do Fleet Foxes que eu entendi (mais uma vez) que a música é a cola que mantém a humanidade em harmonia dentro do caos.

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