Acreditar só vendo, em 2020, se tornou, com certeza, uma expressão amaldiçoada e proibida. Mesmo assim, nossa exposição ao furacão de notícias, sentimentos, ansiedades e incertezas, formam uma visão de mosaico do mundo que nos fazem questionar a realidade exterior e em nosso próprio interior.

A contínua miopia do mundo moderno é explorado pela Gumiber, projeto de  Leonardo Gumiero (ímã / Ankou) e Thomas Berti (Marrakesh), companheiros de idas e vindas musicais há certo tempo, como contam em entrevista para o Mad Sound, “Nós dois já tocamos juntos por um bom tempo em outros projetos. Mesmo com o fim do último deles lá em 2016, nossa afinidade musical nunca deixou de existir. Em 2018 decidimos nos encontrar pra criar seja lá o que fosse. Em meio a tantas possibilidades, esse caminho sonoro foi o que veio de forma mais natural. Passam-se dois anos e decidimos
finalizar duas das músicas que produzimos, surgindo assim o Gumiber.”

E foi no meio de uma onda de impossibilidades que o debut da dupla encontrou seu momento de ser compartilhada com o mundo: “O Que Vejo” / “E O Que Eu Quero Enxergar” chegam via LogoLogo, como single duplo, com referências sonoras desde Aphex Twin até Arca, dando som e nome ao caos. “O maximalismo caótico das faixas vem muito de um estado de liberação nosso quando estávamos produzindo”, conta Leonardo. “Tanto esteticamente, porque no Gumiber nós pudemos experimentar mais do que em outros projetos que participamos, quanto emocionalmente, pra extravasar a ansiedade de estar sempre exposto a tantas informações e narrativas da realidade.”

“O Que Eu Vejo” possui uma desorientação quase palpável, reproduzindo o caos de informações diárias que recebemos, que para nosso azar, são, ao mesmo passo, iressistíveis e, ao longo prazo, letais. A experiência logo fez Thomas e Leonardo sentirem que a canção e sua concepção precisavam de visuais, como conta Berti, e partir de conversa, foi através do diretor e amigo Jonas Sanson que surgiu o filme Algures, colaboração entre a dupla, o artista, e o selo Logologo.

“Durante cada viagem feita pelas plataformas do Google fui observando que diversos lugares eram conectados por cenas comuns do cotidiano”, conta Jonas. “No fim, a sonoridade experimental de ‘O Que Vejo’ acabou dando a vida que as imagens do filme precisavam – enfatizando o ritmo caótico da rotina moderna mas que de alguma forma entram em uma harmonia através das pausas da música, deixando evidente que sem elas somos incapazes de absorver e processar a quantidade absurda de informações que estamos expostos todos os dias.”

A segunda canção, a menos direta, mas certamente não menos instigante e catártica “E O Que Quero Enxergar”, representa, segundo Leonardo, uma janela para uma visão relativa do mundo. “Com os sons mais saturados e um final catártico, que soa quase como uma luta para encontrar ordem no caos, a ideia é querer enxergar alguma coisa além, fazer sentido, mesmo que para cada pessoa seja algo diferente. É isso que esse material quer comunicar, que nossas visões do mundo são projeções, são um esforço de criar uma narrativa no meio de um mar de informações.”

“Parte desse conceito está resumido nas artes do material, já que as formas quadriculadas da capa, quando sobrepostas, formam a cortina que está na contracapa”, ele complementa.

No próximo dia 16, quarta, a dupla irá lançar gratuitamente um samplepack, material com todos os samples utilizados e produzidos na chácara em que o single duplo nasceu, além de sons de objetos encontrados no local, sintetizadores, e vozes processadas, compartilha Thomas.

No entanto, tal como o cenário do mundo e suas incertezas, os próximos passos para lançamento de novas músicas estão sendo estudadas, mas previstas com certeza para 2021. Mais um ano que, sem dúvidas a visão da Gumiber será necessária para expressar a desorientação de uma geração que parece não estar perto de cessar.

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